Carta aberta à professora Ilma Braga

Professora Ilma Braga,
Saudações!

Não tenho posturas ou pensamentos radicais ao mesmo tempo que também não tenho pensamentos ou visões ingênuas. Portanto, partilho com a senhora minhasimpressões e posiçãoa partir de alguns pontos de vista nascidas das minhas leituras de realidade.

1.A História política do Brasil está ai para mostrar que tivemos tantos céus quanto infernos em diferentes governos. Incontestavelmente, um outro Brasil nasce a partir do Plano Real no governo de Itamar Franco e que o ex-presidente FHC teve importante papel nessa construção, sobretudo em questões como abertura e estabilidade econômica e programas sociais. Uma pessoa de pensamentos e visões não radicais ou ingênuos sabe que a reeleição do FHC até hoje carece de explicações e que o processo de venda – as privatizações – das instituições públicas teve início no seu governo. O seu governo foi o que mais privatizou empresas estatais. Uma pessoa de pensamentos e visões não radicais ou ingênuos sabe que o torneiro mecânico Luiz Inácio Lula da Silva em seus dois mandatos conseguiu ampliar os programas sociais do FHC, como o FIES. Igualmente conseguiu criar outros fundamentalmente importante, tirando centenas de milhares de pessoas da linha da miséria com as diversas “bolsas”.

2. Apesar disso, uma pessoa de pensamentos e visões não radicais ou ingênuos sabe por exemplo que esse mesmo Lula para que pudesse chegar ao poder precisou vender a alma ao diabo em negociatas com partidos políticos diversos e com grandes conglomerados de empresas privadas que na sua maioria financiaram a sua campanha. Lula em busca do poder, entrou no sistema de barganha da troca de favores, o famoso “uma mão lava a outra e as duas lavam o rosto”que tal prática tem rastros desde o tempo de Marechal Deodoro da Fonseca.

3. Uma pessoa de pensamentos e visões não radicais ou ingênuos sabe que a Dilma teve a coragem de ampliar o acesso ao crédito financeiro com a medida da redução do IPI e o melhoramento do Minha Casa Minha Vida. Foi ainda no governo Dilma que as mulheres conquistaram maior dignidade e deu voz e visibilidade aos movimentos sociais. Fez ainda importantes reformas estruturantes em setores cruciais da administração pública e ainda garantiu uma maior abertura de vagas das universidades públicas e expansão das mesmas através dos programas FIES, PROUNI e REUNI.

4. Por outro lado, sabe-se também que essa mesma presidenta em harmonia ideológica como o Partido dos Trabalhadores tem referendado por meio de medidas provisórias aprovações de leis comungadas com as determinações feitas no III Congresso do PT, ocorrido entre agosto e setembro de 2007, onde foi aprovada a resolução “Por um Brasil de mulheres e homens livres e iguais”, que inclui a defesa da autodeterminação das mulheres, da descriminalização do aborto e regulamentação do atendimento a todos os casos no serviço público, com a aprovação da PL 1135/91.

5. Sabe-se ainda que foi no Governo de Dilma que aconteceu a proposta do projeto de lei da câmara nº 122/2006 da Deputada Iara Bernard (PT/SP) que ficou conhecido como lei da “mordaça gay”, ou seja, que torne-se réu de crime todo aquele que “disser ou opinar” publicamente sobre a prática homossexual. Além disso traz embutido dentro dessa lei a questão da ideologia de gênero. Nesta ideologia está a defesa da ideia de que as pessoas não apenas não recebem sua sexualidade como um dado biológico já pronto e fixo, mas são responsáveis por construir sua “identidade de gênero” no decorrer da vida, desde a mais tenra idade. Portanto, de acordo com essa ideologia não se pode afirmar que a criança que a mãe do seu ventre é Menino ou Menina, porque isso será ele (a criança) que deverá escolher. Muito resumidamente é disso que trata.

6. Uma pessoa de pensamentos e visões não radicais ou ingênuos sabe ainda que o tempo todo a Dilma e O PT esconderam da população o real tamanho da crise, para tomar medidas de intervenções fiscais de combate à situação enfrentada. Sabe-se também que a oposição fez uso da situação para e que a oposição para radicalizar a situação ainda mais quando coloca o deputado Eduardo Cunha na presidência da câmara, criando um clima de instabilidade ainda maior quando esse mesmo deputado prioriza uma pauta bomba partidarista com o mais claro interesse de destronar o PT do poder. Uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas, sabe que o Partido dos Trabalhadores perdeu sua força, suas raízes e refém de um mídia que deixou claro qual o lado da arquibancada estava sentada aplaudindo. Uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas, sabe ainda que o Poder Judiciário também não deixa clara a sua isonomia e que lá também tem sim militantes do PSDB (Partido que encomendou e financiou o parecer do impeachment pelo valor de 45.00 reais).

7. Portanto Professora, se, em nenhum lado encontramos santos com aureolas redondas e largas, se em nenhum lado encontramos o partido ou político perfeito, uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas jamais poderá catalogar que o outro é que é o diabólico ou usando uma expressão do filósofo francês Jean-Paul Sartre que o “inferno são os Outros”. Não podemos bater no peito e afirmar que categoricamente que “esse” ou “aquele” é o moço ou que o vilão da história. Uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas deixa de lado as suas paixões partidárias, deixa de lado as suas bandeiras de militante de procura analisar o quadro complexo com maior serenidade, imparcialidade e justiça. É fácil? Concordo que não é? Mas qual análise seja ela qual for, se mostra simples e fácil de fazer? A mais simples é complexa. Porém, realidades complexas não podem seranalisadas de forma simples, pois senão cairemos no perigo da superficialidade, depois da parcialidade, um pouco a frente estamos no campo do dogmatismo e quando menos notamos, estamos sentados na cadeira do ditador que cerceia as falas e opiniões alheias.

8. Uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas sabe que a prática da corrupção não começou com o PT e não teremos uma sociedade que descansará em berço esplendido sob margens plácidas. É um engano acreditar que a corrupção terá fim com a extinção do Partidos dos Trabalhadores e que muito menos a corrupção deixará de existir quando o Michel temer assumir. Uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas sabe muito bem disso e que uma das soluções seria uma reforma política séria.

9. Uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas sabe que nesse momento é tempo de baixarmos as armas e as vozes violentas. É tempo de abrirmos mão das cores partidárias e os lados que caracterizam os posicionamentos de militância e abrirmo-nos ao diálogo e construirmos juntos as possibilidades de caminhos para a superação de uma crise política, econômica, ética, de classes sociais, e em última análise, uma crise da razão como instância do pensamento crítico. Por quais caminhos virão as respostas? Por quais instrumentos nascerão as reformas? As respostas podem ser tantas quanto os instrumentos podem ser diversos. Mas o que é possível afirmar é que uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas não abre mão do diálogo em hipótese nenhuma. Esse é o primeiro passo do caminho.

10. Uma pessoa consciente, sem pensamentos radicais ou visões ingênuas não sai em busca dos anátemas do momento. Não busca identificar quem são os inquilinos dos infernos alheios. Pelo contrário, reconhece que todos tem direito a inocência antes que seja promulgada a sentença final e que a verdade não é propriedade exclusiva de nenhuma ideologia ou crença. No mais querida professora Ilma, agradeço pela sua atenção e gentileza. Esses são apenas posionamentos pessoais a partir das minhas leituras de mundo. Não considero que essa seja a única verdade. Mas apenas um simples ponto de vista.
Grande abraço!
Atenciosamente,
Professor Damião Fernandes

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Damião Fernandes

Damião Fernandes. Poeta. Escritor e Professor Universitário. Graduado em Filosofia. Pós Graduado em Filosofia da Educação. Mestre e Doutorando em Educação pela (UFPB). Autor do livro: COISAS COMUNS: o sagrado que abriga dentro. (Penalux, 2014).

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