header top bar

Francisco Cartaxo

section content

E se matarem o juiz Sérgio Moro?

02/08/2015 às 22h40

Por Francisco Frassales Cartaxo

Há quem deseje ver morto o juiz Sérgio Moro, a fim de prejudicar a investigação dos corruptos, da qual ele se fez arauto, sem bazofia e estrelismo midiático. Bobagem. Assassiná-lo é burrice. Na raiz desse sombrio desejo está um hábito inconsciente presente na história de muitos povos: concentrar num personagem a causa ou a solução de problemas vividos pela sociedade. Vez por outra aflora no Brasil, por exemplo, movimento de massa a procura de um chefe, de um rei, de um santo, seja lá quem for, para nos salvar. Assim foi com Antônio Conselheiro, em Canudos, e com o padre Cícero do Juazeiro. Transfere-se a um messias a missão de afastar angústias da alma, chagas do corpo ou da vida. Pensam que, morto Sérgio Moro, o combate frontal à corrupção feneceria. Dessa forma, delinquentes poderosos estariam livres da cadeia e continuariam a roubar como fazem desde sempre. Engano grosseiro.

Isso me faz lembrar conversa com uma juíza, lá se vão 15 anos. Eu espinafrava a venda de sentenças por magistrados venais. Safadeza que eu conhecia de perto. A juíza contestava, embora reconhecendo por ciência própria que colegas seus se enquadravam no perfil por mim traçado. Poucos, é bem verdade. Ela atribuía, corretamente, à pequena parcela corrompida do Judiciário a promiscuidade de juízes com empresários e chefes políticos e entendia que as ligações espúrias com a política local eram resquício do passado.

– Tio Frassales, procuradores e juízes concursados, em sua maioria, não se deixam corromper pelos velhos costumes.

Eu lia nas palavras da jovem magistrada mera projeção de sua ilibada conduta profissional. E temia que a herança da formação do Brasil, da Colônia à República, persistisse, sobrepondo-se ao idealismo das novas gerações. Vejo agora que minha sobrinha estava com a razão. A safra de juízes, nascida com a Constituição de 1988, nestes últimos 20 anos, como decorrência do fortalecimento do Judiciário, em paralelo à consolidação das instituições republicanas, enseja visão otimista na luta contra nossa corrupção endêmica. Não só juízes, obviamente, mas também procuradores, delegados e outros agentes públicos. Isso leva à certeza de que a eliminação física de Sérgio Moro, como alguns desejam, não interromperia o avanço das investigações das malfeitorias da elite que sempre reinou impune. Esse passar o Brasil a limpo, aliás, já começara antes até do mensalão. Ensaios anteriores permitiram acumular conhecimento de enorme utilidade à Força Tarefa que, do Paraná, comanda o desmanche de organizações criminosas, cuja ação deletéria abala os fundamentos da República e deturpa os princípios democráticos.

Não estou subestimando o papel do juiz Sérgio Moro. Mas não o coloco como super-homem. A força de sua ação vem menos dele e mais do ambiente institucional favorável que, entre outros fatores, tem permitido a especialização, sobretudo de agentes públicos do judiciário, do ministério público, da polícia federal. As recorrentes operações conjuntas, como Lava Jato e Andaime, são animador exemplo de mudança na forma de trabalhar dos órgãos públicos, cuja característica mais saliente é a articulação entre eles, muita embora haja disputas internas. Disputas e intrigas, aliás, que empreiteiras gigantes querem explorar para livrar da cadeia potentados como Marcelo Odebrecht, presidente da maior construtora do País. 

P S – Corruptos roubam em segredo, mas processá-los em sigilo faz mal à democracia. Por que o juiz federal de Sousa não revela os nomes dos 39 denunciados até agora pelo Ministério Público Federal?
  

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim foi secretário de planejamento do governo de Ivan Bichara, secretário-adjunto da fazenda de Pernambuco – governo de Miguel Arraes. É escritor, filiado à UBE/PE e membro-fundador da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Autor de, entre outros livros, Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras no cerco ao padre Cícero.

Contato: [email protected]

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim foi secretário de planejamento do governo de Ivan Bichara, secretário-adjunto da fazenda de Pernambuco – governo de Miguel Arraes. É escritor, filiado à UBE/PE e membro-fundador da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Autor de, entre outros livros, Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras no cerco ao padre Cícero.

Contato: [email protected]

Recomendado pelo Google: