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Mariana Moreira

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À alegria, por ela arenguemos!

01/01/2020 às 08h36

Coluna de Mariana Moreira

Por Mariana Moreira

Na modorrenta manhã do dia de Natal, quando as ruas da cidade se recolhem em enfados de ceias e fanfarras, a quietude é quebrada pelo farfalhar de asas que, em voos rasantes, gozam da amplitude do vazio de passos, buzinas, pressas. As piruetas de serelepes pombos singram o azul do céu, permitindo ouvir sutis barulhos de penas cortando ventos e assobiando melodias que, no imaginário, despertam para acordes beethovennianos do Ode à Alegria.

E imaginemos as palavras de Friedrich von Schiller como balizas nos dias novos que se anunciam. E cantemos:

Oh amigos, mudemos de tom!
Entoemos algo mais agradável
E cheio de alegria!

Será apenas fugaz desejo de esperança como lenitivo de dores e sofrimentos impingidos por tempos pandêmicos e turvados de fascismos e intolerância?

Não quero acreditar nisso, pois trago a teimosa mania de apostar no homem como a mais engenhosa criação – divina ou da natureza, ao sabor de cada crença -, capaz de invenções complexas e artefatos sedutores e mirabolantes que redesenham e cartografam espaços, limites, fronteiras, conceitos. Homens capazes de reinventar o próprio viver, mas impotentes quando a necessidade determina a unidade como medida de vida. As divisões – também invenções humanas – seguem classificando, hierarquizando, rotulando, separando em guetos, campos, acampamentos, muros o que traz em sua raiz a impressão da unidade.

E a esperança, riscada no céu pelo voo dos pombos em tranquila manhã natalina, insiste e teima em se fazer concretude. O desejo de rostos escancarados, sem medo de máscaras, espirros e morte. Rostos que, na caleidoscópica composição de cores, formas, idades, expressam a mesma raiz: a origem humana. Rostos, imberbes ou fincados de vivências, explodem sorrisos e afetos.

E o som da melodia é pertinaz em nos sacudir para a vida, superando mortes e reverenciando vítimas de atrocidades cometidas por mãos humanas, caducas de atos afetivos e apertos calorosos. E no holocausto da dor desenhos de Miguel, João Alberto, George Floyd, Marriele, Viviane ganham projeção em nossa memória de luta e alimenta nossa capacidade de resistência e arenga em defesa da dignidade de humanos seres.

E assim, berrar a plenos pulmões,

Ébrios de fogo entramos
Em teu santuário celeste!
Teus encantos unem novamente
O que o rigor do costume separou.
Todos os homens se irmanam
Onde pairar teu voo suave.

Mariana Moreira

Mariana Moreira

Professora Universitária e Jornalista

Contato: [email protected]

Mariana Moreira

Mariana Moreira

Professora Universitária e Jornalista

Contato: [email protected]

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