Compras com minha mãe: um evento
Por Abraão Vitoriano
Já escrevi outras vezes sobre o privilégio de fazer compras com a minha mãe. Ela, essencialmente autêntica, não se acanha em dar pitacos, pedir descontos, reclamar e elogiar a partir do que considera como um bom atendimento: deixar o cliente à vontade e recebê-lo bem, independente do modo como ele está vestido e, principalmente, se aparenta ou não ter dinheiro.
Basta minha mãe entrar numa loja, tudo se transforma num estonteante evento. Com sua sinceridade, não alivia ninguém, inclusive eu. Guardo situações engraçadas e também embaraçosas. Do momento que saí do provador me achando o George Clooney e, no meio de todos, ela disparou: – está roupa ficou terrível em você, não “tá” notando teus peitos pedrados e tua bunda ficou onde?. Ao passo que estava quase superando essa, veio outra: na ocasião comprava um cinto com uma fivela evidente e ela olhou seriamente para vendedora – antes disto tinha me beliscado: – mulher, ele não usa, compra só para se “amostrar”, tu precisa ver lá em casa o tanto dessas coisas perdidas, não gosta de seresta, de festa, nada; aí, me diga, vai usar isto quando?. Mas, ao mesmo tempo, tem o poder de agradar: – viu como esta aí ficou bonita? tuas pernas são grossas desde menino, ficou lindo!.
Admiro demais a sinceridade da minha genitora. E nas compras ontem, selamos novamente aquilo que possuímos de precioso: nossa intimidade de mãe e filho. A cada lugar que visitávamos, a cada sorriso: a alça da bolsa que ficava curta e prendendo no “suvaco” – e pronunciamos a palavra só para achar graça; ela, pediu cerveja, eu, suco de abacaxi com hortelã; nosso andar de mãos dadas em plena faixa de pedestres – o cuidado de mãe como nos primeiros dias de aula. Imagino a minha Maria como uma loja aconchegante e de tons vibrantes nas paredes: uma seção de conselhos e sugestões; outras de palavras de ordem como “lute”, “acredite”, “siga”, mais uma com dramas e puxões de orelha e, a última, uma parte imensa de afeto, inspiração, gentileza cujos preços não existem por serem imensuráveis.
Nas compras com minha mãe, eu não comprei nada comparado ao que recebi gratuitamente: amor, zelo, alegria – marcas de grife sem as quais não viveria.
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