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Cristina Moura

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Meu Pé de Serra

03/03/2022 às 16h08

Coluna de Cristina Moura - Imagem ilustrativa

Por Cristina Moura

Quem nunca foi a um forró na zona rural não sabe o que já perdeu. Ainda há tempo para saborear aquele vento da roça, aquele vento cheiroso, com um pedaço de esperança, mirando um céu estrelado que jamais vai se parecer com o mundo urbano. Jamais. Forró com esse selo também é feito de urbanoides, assim como eu. Estou na lista dos que realmente gostam da roça, têm um pezinho na terra molhada ou na terra pedindo chuva para o plantio.

As pessoas que se dirigem ao forró no sítio, podem ter certeza, são bem recebidas. Não falta animação. Não falta par para a dança. O calor é logo descartado, tamanha a ventilação natural do lugar. Claro que existem os participantes não muito intencionados com bons pensamentos e atitudes. Uma dose ou outra de álcool e a confusão se agiganta. Os anfitriões são preparados, chamam seguranças particulares e pedem a presença da polícia. Muitas vezes, nem é preciso tanto alarde. Quem estiver perto logo aparta a briga, expulsa o confuseiro ou bate um papo rápido para explicar que ali não cabe aquele tipo de insinuação.

O forró no sítio, todos sabemos, é a origem do chamado forró-pé-de-serra, um gênero do forró que enlaça multidões em inúmeras casas de shows e faz a fama de tantos artistas. Por mais consagrado que seja o grupo, no entanto, é naquela roça que o artista se acha, é naquela palhoça que ele se identifica com o próprio gênero. Cansei de ver bandas nascidas e criadas no seio urbano com essa propaganda de pé-de-serra, mas que, no frigir dos ovos, nunca pisaram num lajedo. Tudo bem. Vale a homenagem que o pessoal quer fazer aos pioneiros. Alguns arriscam dizer que o avô ou bisavô ou tetravô nasceu no sítio tal e qual.

No forrobodó da zona rural, o autêntico, a banda respira o que há de mais original. Basta um acorde da sanfona, uma batida da zabumba e o tilintar do triângulo para diagnosticar como será a festa. Se o sanfoneiro for bom cantor também, está garantido o ingresso. Nem sempre isso acontece. E isso não significa que o evento seja ruim. O povo se engalfinha e nem escuta a letra.

Contamos com a sorte, nós, brasileiros, de admirar um excelente tocador, Luiz Gonzaga. Sanfoneiro, na mais fina essência, de olhos fechados. Também excelente cantor. Com uma voz especial, encorpada, por vezes aveludada, fazia o que bem queria para emocionar e alegrar quem estivesse no salão. Como artista não morre, nunca, o salão sempre estará aberto. O Rei do Baião trafega com tranquilidade por outros gêneros associados ao forró. Sua obra é prova disso. Gonzagão é o símbolo do pé-de-serra, que ganha balanço de sobra com xaxado, maracatu, xote, coco, marcha, maxixe, tango. E os aboios, orações musicadas. Um universo de personagens. Para quem quiser rezar, de forma mais concentrada, é só fechar os olhos e ouvir a lindíssima Ave Maria Sertaneja.

Falo do nosso querido Gonzaga, mas são muitos e muitos os representantes desse pé-de-serra abençoado. Cada um aciona um causo, uma história, algo que tenha me marcado nas minhas andanças. É comum lembrar os anúncios dos forrós nos sítios, nas rádios AM. Sem essa propaganda, a ciranda não está tão completa. É preciso avisar, chamar o povo, causar rebuliço. Bora, minha gente. E começa logo que escurece. Às dezoito horas, pode chegar.

Cristina Moura

Cristina Moura

Jornalista e Professora cajazeirense, radicada no estado do Espírito Santo.

Contato: [email protected]

Cristina Moura

Cristina Moura

Jornalista e Professora cajazeirense, radicada no estado do Espírito Santo.

Contato: [email protected]

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