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Abraão Vitoriano

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Natal sem fome e a grande contradição

11/12/2011 às 09h43

Neste período natalino, muitas pessoas e instituições promovem campanhas humanitárias louváveis, dignas de reconhecimento. Uma das campanhas chama-se natal sem fome, cujo objetivo é matar a fome de muitos cidadãos no dia do natal.

Nada contra, pelo o contrário. Muitas encampam essa campanha por amor ágape, visando tão somente o bem estar dos irmãos. Outros, porém, fazem-na por pura demagogia, hipocrisia. Muitas vezes por puro exibicionismo. Pensando que sua ação de final de ano vai agradar a Deus, o pai dos pobres excluídos, marginalizados por esta sociedade tremendamente excludente, individualista, injusta, desumana, consumista, onde a pessoa humana não vale pelo que ela é, mas pelo o quem tem.

Muitos ricos estão aí, a todo vapor, arrecando toneladas de alimentos, roupas, brinquedos para ser distribuídos no natal. Eles dizem que vão fazer as famílias pobres ficarem felizes na noite do natal. O gesto seria tão cristão, quanto bonito, se não fosse recheado de hipocrisia, exibicionismo, como tenho afirmado peremptoriamente.

Particularmente, gostaria de fazer alguns questionamentos sobre essa campanha do natal sem fome, promovida pela a alta sociedade, ou senão, pela a elite, que vive nadando durante o ano todo em mordomias, bem estar pessoal, familiar e social:

Para a elite, a fome só existe no final do ano, ou seja, no natal? E a fome que mata tantos filhos de Deus, só é perceptível neste tempo natalino? Ora, se a fome campeia durante o ano todo, então, onde estão os ricaços que não olham para os famintos no transcorrer dos 365 dias?

Será que para a elite rica, poderosa, a fome é só de comida? E a fome de justiça social, de dignidade, não existe?

Por que não há uma preocupação com as injustiças que agridem a dignidade do povo pobre?

Por que os pobres só são lembrados no final do ano, especialmente no natal?

Por que muitos da elite maldizem os que lutam por terra?

Por que as elites não promovem ações sociais que podem beneficiar a comunidade pobre?

Se são ricos, por que campanhas pela TV, rádio, internet,visando arrecadar alimentos, roupas, brinquedos? Por que não compram com seu próprio dinheiro que apodrece nos bancos do Brasil e do exterior? Cadê o espírito cristão de partilha?

Durante o ano, quantas vezes as pessoas abastadas, economicamente falando, ajudaram os filhos de Deus que clamam por pão, roupa, remédio?

Conversando com algumas pessoas pobres, humildes, necessitadas, sobre essa campanha promovida pela a elite e instituições poderosas, ouvi delas o seguinte:

-Padre Djacy, por que esses ricos só aparecem agora com suas cestas básicas?

-Padre, os ricos pensam que vão matar nossa fome com uma cestinha básica dada na noite de natal;

-Por que eles não nos ajudam durante o ano todo?

-Padre, minha mãe precisa de uma cirurgia, já pedi a todo mundo, e nada. Cadê que os ricos nos ajudaram? Nada!

-Olhe, seu padre, conheço uma pessoa que precisava de uma cadeira de roda, pedi as pessoas endinheiradas, mas nada.Sabe quem me ajudou? Uma família que vive de dois salários mínimos.

-A gente chega à casa de gente rica, importante, e nem nos sentimos bem. É tanta formalidade

-Padre, a gente não quer esmola, quer emprego, dignidade

-Esmola é a pior humilhação para os pobres que querem trabalho

-Minha mãe precisava de uma cirurgia,lutei,lutei, e nada. Pedi ajuda as pessoas abastadas, e nada. A comunidade fez uma campanha para pagar a cirurgia de minha mãe.

-Padre, Essa gente que faz essa campanha é contra os movimentos sociais, como o MST e outros

-Quando os pobres vão para rua lutar pelos seus direitos, a elite poderosa chama a gente de vagabundos, de vadios, malandras, preguiçosos….

-Já vi gente rica dizer assim: pobre é para servir os ricos.

-Muitas vezes, essa gente que anda fazendo a campanha natal sem fome diz que os pobres só são pobres, porque são vagabundos, malandras, preguiçosos.

-Por que essa gente rica, poderosa não fica do nosso lado quando a gente luta por reforma agrária, por moradia, por emprego, por justiça social?

-Muitas dessas pessoas que estão fazendo a campanha do natal sem fome são contra os pobres que brigam por terra, casa, justiça, dignidades.

-Por que essas instituições ricas que estão fazendo a campanha natal sem fome, não promovem todo mês uma semana de assistência médico-odontológica, nas comunidades carentes?

-Se o pobre for pedir uma consulta médica ou um exame a uma dessas instituições, meu Deus, sai de lá correndo.

-Engraçado, padre, os ricos só vêm a nossa comunidade uma vez ao ano trazer essas esmolas e, além disso, vêm acompanhado de fotógrafos, televisão… Por que tanta mídia na entrega dessas feiras?

-Olha, padre Djacy, conheço uma família que, uma vez ao ano, faz campanha do natal sem fome, mas, sabe quanto gasta por mês com sua cadela de estimação? Gasta mais de mil reais.

-Esse povo rico pensa que só existe fome no fim do ano. Padre, na minha comunidade tem gente que passa o ano com fome, sabia?

-Padre, para nós, essas campanhas não resolvem nada, pelo o contrário, nos humilham.

-Olha padre, no dia da entrega das cestas básicas, os ricos chegam na nossa comunidade em seus carrões, acompanhados de seus animais de estimação.

-Padre Djacy, seria muito melhor que os ricos nos apoiassem nas nossas lutas por terra, moradia, emprego, saúde e educação de qualidades, segurança;

-Sei padre, tem tanta gente rica que só pisa no chão porque é o jeito. Essa mesma gente, no final do ano chega nos dando cestas básicas.Será que não é para aliviar sua consciência pesada?

Não serei tão radical a ponto de generalizar. É notório que há muitas pessoas da elite que dispõem de espírito humanístico, de partilha, de solidariedade, que se preocupam com o sofrimento das pessoas que vivem à margem da vida. Para essa gente que vive, de fato, o evangelho, a fé cristã, meus aplausos. Para os egoístas, preconceituosos, arrogantes, individualistas, que só se lembram dos pobres no natal, minha oração e desejo de conversão sincera. Antes que seja tarde demais, claro!

Para os ricos gananciosos, que não dispõem de espírito de partilha, de amor ágape aos pobres, que só se lembram dos pequenos no natal com sua fajuta campanha natal sem fome, valem as palavras de São Basílio (+379):

“Aos famintos pertence o pão que guardas. Ao homem nu, o manto que guardas até nos teus cofres. Ao que anda descalço, o calçado que apodrece em tua casa.Ao miserável, o dinheiro que guardas escondido.É assim que vives oprimindo tanta gente que poderia ajudar”

“Se cada um conservasse apenas que se requer para suas necessidades correntes e deixasse o supérfluo para os indigentes, a riqueza e a pobreza seriam abolidas”.

“Quem é o avarento? Uma pessoa que não se contenta o necessário. Quem é o ladrão? Uma pessoa que tira de alguém aquilo que lhe pertence”.

E São João da Cruz, o santo místico, dizia: “no entardecer da vida seremos julgados pelo o amor”.

Finalmente, Jesus, a autoridade por excelência no assunto: “amai-vos uns aos outros como eu vos tenho amado”.

Fé cristã não combina com hipocrisia!


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Abraão Vitoriano

Abraão Vitoriano

Formado em Letras e Pedagogia. Pós-graduado em Educação. Escritor. Poeta. Revisor de textos. Professor na Faculdade São Francisco da Paraíba e na Escola M. E. I. E. F Augusto Bernadino de Sousa.

Contato: [email protected]

Abraão Vitoriano

Abraão Vitoriano

Formado em Letras e Pedagogia. Pós-graduado em Educação. Escritor. Poeta. Revisor de textos. Professor na Faculdade São Francisco da Paraíba e na Escola M. E. I. E. F Augusto Bernadino de Sousa.

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