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Edivan Rodrigues

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O discurso de Sarney

21/06/2009 às 10h11

Por Francisco Cartaxo

Na hora do discurso, as mãos de Sarney tremiam. Mãos e voz tremiam por esconder segredos. Talvez. É a idade, me alertaram para os 79 anos de um dos mais bem sucedidos camaleões em meio século de política brasileira. Ao ouvi-lo, terça-feira, dia 16, defender-se de denúncias, segundo as quais o senado navega em águas turvas, me veio à memória antiga imagem dele, olho na câmera da tevê: “A inflação acabou”. Foi em 1986, no auge do sucesso do Plano Cruzado, Sarney presidente da República. Gente simples virou “fiscal de Sarney” a fustigar acuados comerciantes, transformados então em perigosos inimigos da pátria… Os mais jovens nem sequer ouviram falar disso.

Agora, fiscalizado pela mídia, Sarney luta (que tristeza!) para esconder atos secretos que desabonam a democracia. São nomeações à margem da lei e dos bons costumes, arranjos de gaveta, pagamento de horas extras em época de recesso, enfim, um rosário de falcatruas denunciadas a cada dia. Por isso o presidente do senado resolveu falar. Combinou com os outros, distribuiu tarefas entre os pares, assegurando-se de que não teria apartes, mesmo sendo favoráveis. Tudo combinado.

Assim aconteceu. Cabelo, barba e bigode aparados, terno e gravata escolhidos no capricho. Para quê? Para o show na tribuna. Todos nós vimos na transmissão ao vivo ou em noticiário de tevê. Estava tudo combinado. Até as frases de efeito. Tudo? Quase tudo. As mãos saíram do controle, trêmulas como a voz. Durante 33 minutos, mãos e voz afundaram Sarney na insegurança de seus argumentos. Não convenceu.

“A crise não é só minha, todos nós somos responsáveis. Nós aprovamos os atos da Mesa. O senado no seu conjunto aprovou os atos da Mesa.” Assim, diluídas as responsabilidades, todos são culpados, ou melhor, ninguém será punido. Tudo combinado. Não convenceu ao usar generalidades, que ele foi buscar até em democracias longínquas, a insinuar conspiração em escala mundial contra os parlamentos. Engodo. Pinçar daqui e dali pedaços de verdades, sem contextualizá-las é justificativa de quem carece de argumentos. O apelo emocional, familiar, o emprego da neta, as agruras da filha doente, também não comoveu… Nem convenceu recorrer à própria história. “Eu, depois de ter prestado tantos serviços a esse país, depois de passar pela presidência da República e enfrentar a transição democrática, fui o único governador do Brasil que não concordou com o AI 5. Quem foi o relator da matéria que acabou com o AI 5? Fui eu.”

Teria escutado mal? Fui conferir o texto no jornal impresso. Santo Deus, o homem foi presidente do partido de sustentação da ditadura, mandou e desmandou no Maranhão à sombra dos militares, desde quando se elegeu governador, em 1965, após entrar na política pela mão de Victorino Freire. O mesmo Victorino que, após 1964, Sarney combateu como chefe do “obscurantismo de uma oligarquia de 20 anos”… Em suas memórias, Victorino traçou-lhe o perfil: “Vaidoso e oportunista, sabia esperar para ver de que lado estava soprando o vento, a fim de assumir posições que lhe fossem favoráveis.” Sarney modernizou métodos de dominação, fez-se novo oligarca. Para quê? Para desenvolver o Maranhão? Não. Os indicadores econômicos e sociais evidenciam essa verdade. Ficou no discurso. Antes, como hoje.

Edivan Rodrigues

Edivan Rodrigues

Juiz de Direito, Licenciado em Filosofia, Professor de Direito Eleitoral da FACISA, Secretário da Associação dos Magistrados da Paraíba – AMPB

Contato: [email protected]

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Juiz de Direito, Licenciado em Filosofia, Professor de Direito Eleitoral da FACISA, Secretário da Associação dos Magistrados da Paraíba – AMPB

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