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Abraão Vitoriano

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O povo ainda é cego

27/03/2012 às 10h47

Infelizmente, em pleno século XXI, no interior do Nordeste, o povo ainda não tem consciência de sua cidadania, dos seus direitos mais elementares, como educação, moradia, saneamento básico, saúde etc., levando-o, conseqüentemente, a ser presa fácil de muitas lideranças políticas que se aproveitam dessa situação, usando da má-fé.

A cegueira cidadã ainda é uma grande realidade. Ela está muito enraizada na vida de um povo sofrido, massacrado, excluído, tratado com desdém ou massa de manobra. E o pior, ainda não existe uma política educacional suficiente, por parte do governo, capaz de erradicar, de uma vez por todas, essa praga geradora de politicagem, assistencialismo, coronelismo e comercialização do voto. Estratégia político-ideológica? Só pode ser. Está na cara.

Para a maioria da população interiorana, os benefícios que vêm para sua comunidade, urbana ou rural, como posto médico, calçamento, saneamento básico etc. são tidos como frutos da compaixão ou benevolência dos seus líderes (prefeitos, vereadores, deputados etc.). Nesse caso, então, os seus representantes municipais, estaduais e federais são todos canonizados. Canonizados, são merecedores de aplausos, louvores e festas. Esses santos comem até a única galinha do chiqueiro dos pobres. E toma festa regada à bebida e música.

Com muita tristeza, dor e pessimismo, confesso que nosso povo, com raras exceções, devido à sua grande cegueira cidadã, não possui postura crítica, é acomodado, medroso, dependente, sem iniciativa ou espírito de luta em termo de reivindicação dos seus direitos, possui visão determinista ou fatalista, o que o leva à subserviência ou dependência generalizada.

Exponho, de forma literal, o que tenho ouvido e continuo ouvindo de inúmeras pessoas, a respeito de sua cidadania, ou melhor, dos seus direitos inalienáveis:

-Padre, eu não sabia nada dos meus direitos de cidadão.

-Olha, seu padre, até ontem eu era cego, ignorante com relação aos meus direitos de cidadão.

-E a gente tem direito à consulta médica, a remédio, a cirurgia, a ambulância de graça? E o governo dá pra gente, é?

-Meu amigo, nossos representante são bons demais, eles nos dão remédio, casa pra gente morar, arruma transporte para levar a gente quando vamos viajar,

-Na nossa comunidade não tem nada, nada, nada. Mas a gente gosta dos nossos representantes porque eles fazem festas e mais festas para nós.

-Padre, a vida é assim mesmo, pobre nasceu para sofrer. Só Deus para melhorar a nossa vida.

-Tem jeito não, se a gente passa fome, não tem emprego, não tem casa, terra, médico, remédio é porque Nosso Senhor quer. Vamos morrer assim mesmo, padre. Não tem jeito não. É vontade de Deus.

-Padre Djacy, me diga quais são os nossos direitos. A gente tem direito a tudo nesta vida?

-Prefeito bom é aquele que faz festa e mais festa para nós. Eita homem bom danado.

-Lutar pra que, se a gente não consegue nada com os políticos?

-Na nossa comunidade não tem nada. Então, é só esperar a boa vontade do prefeito, dos vereadores e deputados.

-Padre, nós vamos fazer uma festa para o deputado tal, e o prefeito tal e nossos vereadores. Eles trouxeram tanta coisa boa prá nós. Eles merecem uma festa grande.

-Quem é doido de lutar para melhorar nossa vida. A polícia bate em nós, bota cachorro atrás de nós, e muita bomba. Deus me livre. Prefiro ficar em casa, esperando a boa vontade dos homens.

-Padre, faz anos que a nossa situação é assim, triste, e ninguém faz nada. Quando chegam as eleições, eles dizem assim: votem em mim, porque quando eu ganhar vou trazer água boa, posto médico, dentista, açude. Quando eles ganham esquecem de nós.E ninguém fala nada com medo.

-Olha padre, ai daquele que denunciar uma coisa errada na nossa cidade. A perseguição é muito grande. A gente se fizer denuncia de coisa errada, não recebe mais nada do prefeito, do vereador, do deputado.

-Se a gente denunciar que falta médico, que falta merenda na escola, que falta calçamento na nossa rua e outras coisas, a gente não tem mais direito a nada,quando precisar,como exemplo, a ambulância, o remédio…

-Esse negócio de lutar por direitos é coisa de revolucionário, de doido, de baderneiros, a gente vê pela televisão. Esse pessoal que luta é um bando de vagabundo, de malandra, precisa mesmo é apanhar da policia.

-Padre, a gente não sabe de nada de nossos direitos

-Nesta comunidade não tem água, não tem posto médico, não tem dentista, não tem calçamento, e o povo não ta nem aí, seu padre. O povo daqui fica feliz quando os homens lá da prefeitura fazem festa e mais festas.Ai todo mundo fica feliz.Aqui o povo quer saber é de festa,padre.

-Meu amigo, o deputado tal é tão bom, tão bom, que trouxe umas casas para os pobres. Pense num deputado bom danado?

-Padre, preciso fazer uma cirurgia, mas não vou pedir à secretaria da saúde, porque não votei no prefeito tal.

-No final do ano, as mulheres dos políticos trazem feiras e presentes para nós. Eita povo bom demais. É por isso que a gente só vota nesse povo bom demais.

-Eu não sabia que a gente pagava imposto e esse imposto era para nos beneficiar,para a saúde,educação,segurança,moradia,saneamento básico.Eu não sabia nada disso.

-Padre Djacy, eu não falo nada, porque quando eu preciso de um carro para pegar meu filho em determinada cidade, que vem de viagem, eu consigo na prefeitura.

–nosso prefeito é bom demais, ele me arrumou o carro para levar minha mulher no aeroporto de j.pessoa. Não paguei nada. Vou votar nele.

-Padre, o senhor não prega o evangelho, não fala de Jesus, só fala em tal de cidadania, de casa, de terra, de educação, de água, de saúde. O senhor deveria falar do céu, do inferno, do purgatório, de rezas, dos santos. Vá rezar direito, seu padre.

-padre, vá pregar o evangelho, falar de Deus, dos anjos. Deixe de falar em emprego, em comida, em justiça. Esse negócio de tal de direitos, de casa, água é coisa para os políticos, e isso eles fazem bem direitinho.

-O senhor não prega sobre Jesus, só fala em tal de justiça social, em fome, violência, cidadania. O senhor deveria era ensinar o povo a rezar o terço, o ofício. A gente quer é isso, reza, louvor a Jesus.

-A Igreja Católica tá errada quando fala em pobres, em oprimidos, em tal de doutrina social, marginalizados. Ela deveria assumir a função dela, que é pregar a palavra de Deus.

-Esse padre da nossa comunidade é comunista, só fala em lutar, brigar por direitos, só fala em água, em salário, em moradia. Ave Maria, o bispo deveria tirar esse padre politiqueiro daqui. Ele é muito perigoso, nossos políticos estão de saco cheio com esse vigário comunista, ateu.

-Nosso padre é bom demais, padre Djacy, ele passa o dia na igreja botando o povo prá rezar. A gente passa o dia só na reza e no louvor. A gente reza para Deus nos livrar da nossa miséria, do desemprego, da violência, de tantas injustiças. E assim ele fala pra nós.

Diante deste contexto histórico exposto, urge, que nós, cristãos e cristãs, façamos uma evangelização sócio-libertadora, visando libertar o povo dessa situação de alienação generalizada. Para isso, requer determinação, paciência, renúncia e coragem profética.

Jesus é nosso modelo primeiro nessa linha de seguimento profético de libertação integral da pessoa humana: “Se a mim me perseguiram, também vos perseguirão a vós (Jo. 15,20).


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Abraão Vitoriano

Abraão Vitoriano

Formado em Letras e Pedagogia. Pós-graduado em Educação. Escritor. Poeta. Revisor de textos. Professor na Faculdade São Francisco da Paraíba e na Escola M. E. I. E. F Augusto Bernadino de Sousa.

Contato: [email protected]

Abraão Vitoriano

Abraão Vitoriano

Formado em Letras e Pedagogia. Pós-graduado em Educação. Escritor. Poeta. Revisor de textos. Professor na Faculdade São Francisco da Paraíba e na Escola M. E. I. E. F Augusto Bernadino de Sousa.

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