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Cristina Moura

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Pita na fazenda

04/07/2021 às 18h05 • atualizado em 04/07/2021 às 18h07

Coluna de Cristina Moura. (Foto: ilustrativa/reprodução/internet).

Por Cristina Moura

Conheci Pita na minha infância. Era meu desafeto porque, já contei noutra crônica, representava o jacaré no parque de diversões. Vituriano, o rival político, era o leão. Minha mãe não deixou que eu andasse nos dois brinquedos. Disse que eram muito perigosos e que eu não poderia ir sozinha. Também não conseguimos alguém para me acompanhar. Sim, pois eu queria rodar nos dois. Na verdade, verdade verdadeira, eu queria experimentar todos. Cursava o Ensino Fundamental. Na época, Primeira Série. Uns seis anos de idade. Piolho de quando em quando. Metida a artista.

Acabei entrando apenas no Pula-Pula, com Glayzianne e outra turma de primos dela, depois de quase trinta minutos de espera. Entramos todos nós, onze ou doze criaturas. Que lugar enorme. Que lugar encantado. Todo iluminado. Todo ventilado. Voamos. O chão amolecido feito um enorme algodão. Pulei. Pulei. Estirei-me naquele plástico pisado por tantas outras crianças. Todas devidamente calçadas com meias e prometendo e jurando que não cuspiriam no local.

Antes de acabar meu tempo, resolvi sair. Vi um ponto molhado logo adiante. Algo do tamanho de um notebook. Eu não quis verificar o teor da substância líquida. Poderia ser urina, poderia ser refrigerante, poderia ser água, poderia ser suco, poderia ser suor. É sério. Saí. Minha mãe se surpreendeu com minha destreza e minhas acrobacias, mas sobretudo porque não utilizei meu tempo total. Uns dez minutos. Cinco foram suficientes para eu matar a vontade. Ainda bem que meu estômago estava vazio.

Muito suspeito, falou a pequena repórter. Uma água estranha. Silêncio. O som quebrou. Era Fevers. Voltou. Falei o que vi. Falei que achei um absurdo. Mas, claro, sem esquecer a parte boa. Agora eu preciso de um lanche, pedi. Por ali, nada me apetecia. Estava com sono e fingindo não estar. Exercício duro. Na esquina da Rua Souza Assis, mais um exemplo da nobreza da simplicidade: milho assado. Abocanhei. Depois, casa. Banho. Sono. Sono. Domingo. Sono. Sonhos.

Contei tudo isso ao médico Epitácio Leite Rolim, quando fui sua assessora de Comunicação, junto com meu irmão Christiano e outros amigos da imprensa cajazeirense. Mas não contei num episódio de campanha. Foi numa visita informal, na fazenda da família. Era diferente estar ali, cara a cara com um cara que já tinha sido Chefe do Executivo Municipal por três vezes. Uma honra. E ele: não me chame de doutor. Chame de Pita. Chame de Epitácio. Adoro quem me chama de Pita, disse.

Foi um ótimo papo com o homem que foi o meu primeiro médico ortopedista, quatro anos depois do episódio do parque. Obedeci a um tratamento para o ajuste das aberturas nas plantas dos pés. Para isso, fiz uso de uma palmilha ortopédica, durante um ano. Ele explicou: evite esportes que forcem a sua pisada, pois você pode virar um dos pés, originar varizes e machucar terrivelmente os tornozelos; mas se você seguir direitinho, dará tudo certo.

Até fiz as pazes com minha imaginação, depois do diálogo com o novo amigo. A palmilha andou no meu tênis ou sapato durante doze longos meses. Que tortura. Mas, tudo bem. Melhorei. Todo medicamento requer um sacrifício. A mente precisa compreender o que se passa. No final, chega um alívio. Saem das costas trilhões de pensamentos e dromedários. Saem as dúvidas.

Relembramos tudo isso, bem devagar, ao som pacato da roça. Passarinhos cantando. Cafezinho com tapioca. Biju e bolo de milho. Dona Zarinha sorrindo. Seu Pereira, aqui e ali, conversando com quem chegava. Meus colegas falando de Deus e do mundo. Pita dizendo que gostava de Led Zeppelin. Lembrando daquela belíssima canção que fala das escadas para o paraíso.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Cristina Moura

Cristina Moura

Jornalista e Professora cajazeirense, radicada no estado do Espírito Santo.

Contato: [email protected]

Cristina Moura

Cristina Moura

Jornalista e Professora cajazeirense, radicada no estado do Espírito Santo.

Contato: [email protected]

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