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Cristina Moura

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Poemas ambulantes

03/04/2021 às 17h01 • atualizado em 03/04/2021 às 17h03

Poemas ambulantes

Por Cristina Moura

Neste período de cheia da Lua, ando à caça de poemas ambulantes. Meu bodoque de caçadora, em tempos não tão dóceis para todo o planeta, encontra por ali um pardal catando folículos de alimento. Olho bem, mas pareço não entender os detalhes. Sim. É por isso que me conformo com as exclamações que surgem com o barulho do bambuzal. Vejo, como se me preparasse para uma reza. Pronto. Silencio com uma respiração pausada, que conta cada milésimo de segundo, em respeito à natureza.

Poesia existe em cada recanto do universo, em cada palavra amiga que vem acenar com uma melodia de aconchego. Não são as frases somente poetizadas, mas as ações, os jogos que sempre empatam com sorrisos de contentamento e torcidas que comemoram. Meu estilingue não mata: acerta alvos simples de sonhos que nunca morrem. É a mesma baladeira, inocente a mirar latas velhas empilhadas.

Que poemas tantos, em todos os lados, que se auxiliam. Tantos e tantos. São todos eles a pintar cada arrebol, palavra que parece ecoar em vozes pouco ouvidas no nosso cotidiano. Meu bodoque caça tantas coisas, para ficar somente lembrando. Meu bodoque gosta de não esquecer, de colecionar o que alumia. Às vezes, o passo parece que tropeça, empaca em algum pedaço de cinza. Mas, respiro. Bebo água, na minha caminhada incessante. E, por acolá, sorvo um capim do mato, espero a lagarta se esconder, ouço os sinais da neblina. Cato as pedrinhas arredondadas, que não precisam do meu esforço para a lapidação; aquelas de beira de riacho ou enfurnadas em lodo de açude, lisinhas, tão lisinhas que parece que nasceram para enfeitar.

Poemas estão aí, para quem quiser caçar. No meu bornal, ainda cabem poucos recortes. É que não sei, talvez, detectar o que é poema mesmo, certificado pelo tempo. De repente, há um no meu colo e eu nem percebi. De repente, há um na vizinhança e eu ainda não conheci. De repente, e de repentemente, pode existir algum no calor do dia. Até mesmo pode existir numa carta, no trajeto, na sequência dos acontecimentos entre remetente e destinatário. De repente, há um repente que se coloca nos dedilhados da viola e eu ainda não quis escutar.

É desse jeito, meu povo, meus eleitores e leitores. Minha saga é uma eleição de mim comigo, um pleito aberto e escancarado numa disputa de mim com minhas sílabas. Esse mim não seria quase nada se não fosse o que lê. Sou grata a quem compartilha dessa minha pequena assembleia. Sou grata a quem procura compreender essa minha campanha de mim pela minha consciência. Carros de som, panfletos, cartazes, postagens eletrônicas, palanques, microfones ligados para sussurros ou ideias ou clamores ou viagens. Meu comício estará sempre agendado. Sim. Sou candidata a esse diálogo que não se conclui. Peço benção a quem abençoa. Peço graça a quem graceja. Peço paz a quem pacifica. Peço o seu voto.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Cristina Moura

Cristina Moura

Jornalista e Professora cajazeirense, radicada no estado do Espírito Santo.

Contato: [email protected]

Cristina Moura

Cristina Moura

Jornalista e Professora cajazeirense, radicada no estado do Espírito Santo.

Contato: [email protected]

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