Por que escrevo?
Nesse exato em que tento escrever algo sobre alguma coisa, torna-se imperativa dentro de mim a seguinte inquisição: por que escrevo? Há os que escrevem livros que os imortalizam, há os que escrevem diários que são esquecidos, como as memórias guardadas no silêncio da consciência. Alguns que escrevem por prazer, outros por uma obrigação curricular.
Uns se dirigem aos leitores imaginários, outros querem apenas aumentar a folha corrida para disputar em melhores condições os possíveis concursos e/ou cumprirem as exigências formais e institucionais. Não há a intenção de julgamento moral, pois todos somos escravos da competição desenfreada e da ideologia meritocrática.
Há os escritores elitistas que se imaginam gênios em suas torres de marfim, onde pensam encarnar a verdade e o mundo se reduz ao próprio umbigo. Estes escrevem como se a realidade, o mundo material, não existisse, mas apenas os conceitos, as categorias universais, o mundo do intelecto. Há mesmo os que torcem o nariz diante da hipótese de escreverem artigos, pois os consideram efêmeros e supõem que os livros eternizam. Há também os maquiavéis modernos que escrevem como conselheiros do príncipe de plantão, na ilusão de que este, ou quem sabe os seus assessores mais próximos, o leiam.
Por que Escrevo? O que na verdade me atrai á esta arte tão árdua e ao mesmo tempo prazerosa? Será apenas o desejo de ser lido, conhecido, comentado? Será que sou motivado pela vaidade?Fico ainda a pensar, que existem aqueles que escrevem para transformar o mundo, palavras que anunciam utopias e, muitas vezes, encharcadas de um dogmatismo intolerante, próprio dos que querem salvar o mundo e as almas dos demais não importa qual o meio. Em tempos de internet, aliás, não é incomum o proselitismo dos missionários e panfletários que, bem alimentados e acomodados em suas poltronas à frente do computador, imaginam fazer a revolução.
Em certo sentido, sinto-me assemelhado a esses. Muitas vezes me sinto um prosélito das Idéas, um dogmático intolerante. Reconheço que algumas vezes minhas idéias são fermentadas por um dogmatismo. Mas, não é isso pelo qual escrevo. Por que Escrevo?Estando a pensar sobre essas razões, me deparei com um texto onde o autor de “A Revolução dos Bichos” relaciona quatro motivos que, em maior ou menor grau, impulsionam a escrever:
O primeiro motivo que é colocado por ele é o egoístico: O desejo de ser engenhoso, de ser comentado, de ser lembrado após a morte, de se desforrar de adultos que o desdenharam na infância e por aí afora. É uma falsidade fazer de conta que este não é um motivo forte” […]
O segundo motivo é o entusiasmo estético: A percepção da beleza no mundo externo ou, de outro lado, nas palavras e em seu arranjo correto. Prazer no impacto de um som sobre outro, na firmeza de uma boa prosa ou no ritmo de uma boa história. O desejo de compartilhar uma experiência é valioso e não se deve deixar escapar.
O terceiro motivo é o impulso histórico: O desejo de ver as coisas como elas são, de encontrar fatos verídicos e guardá-los para o uso da posteridade.
E por último o propósito político: A palavra “político” entendida aqui em seu sentido mais amplo. O desejo de lançar o mundo em determinada direção, de mudar as idéias das pessoas sobre o tipo de sociedade que deveriam se esforçar para alcançar. Também neste caso ninguém está verdadeiramente isento de tendências políticas.
Reconheço, que lendo este fragmento do autor George Orwell, percebo em mim algumas destas motivações. Mas segue ainda em mim a imperativa inquisição inicial: Por que escrevo? Acredito, que esta é uma daquelas respostas que não a encontramos pronta e acaba. Ela nasce no percurso de cada texto escrito, de cada estrada trilhada, de cada frase construída pela gramática da vivência.
Para saber mais
ORWELL, George. A revolução dos bichos. Rio de Janeiro, Biblioteca O Globo, 2003.
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