Saia da Caverna
Por Damião Fernandes
Platão examina o processo de libertação de um dos prisioneiros da caverna. Possibilidade que a princípio parece estranha para o filosófo, pois o que faria libertar-se? Platão caracteriza esse processo como um processo difícil, doloroso e até mesmo sofrido. É estranha a maneira como Platão descreve o momento em que acontece de forma gradual a libertação de um dos prisioneiros da Caverna, onde está nesta condição desde a sua infância.
Percebemos pela explicação do próprio Platão, que o prisioneiro não é libertado por nenhuma força externa, mas por um conflito interno entre duas forças que se encontra em sua alma, a força do hábito ou da acomodação e a força do impulso, da curiosidade, que o estimula para fora, para buscar algo além de si mesmo. Como quem busca a possibilidade da abertura de uma Janela, onde possa vislumbrar a partir dela uma nova realidade. A força do hábito possibilita a que o homem se sinta confortável a sua situação de ignorância, de “não-entendimento” que arrasta desde a infância, ao passo que a força da curiosidade o torne insatisfeito, frustrado e infeliz.
Platão parece inaugurar aqui a idéia de que a educação baseada em costumes ou em tradições, mostra-se muitas vezes barreira para a construção do novo. Quando ideais educacionais ou práticas pedagógicas se fundamentam em costumes habituais e/ou tradições vazias, torna o homem – que é objeto primeiro da educação – em ser nebuloso e alienado, não conhecendo o mundo que o rodeia.
A educação platônica traz em si a capacidade de libertar o homem de si mesmo, de seus condicionamentos e grilhões. Essa educação liberta-o de realidades exteriores que o impede de contemplar lucidamente e atingir o mundo inteligível, o mundo do saber. Uma concepção de uma educação onde o processo educacional libertador tem inicio a partir de dentro, da tensão dialética no interior do homem.
A educação platônica procura provocar no homem uma harmonia estrutural no seu psiquismo e na suas relações enquanto ser social e dinâmico. Em Platão a educação do homem era uma realidade que estava fortemente relacionada com o ideal de pólis. O ideal da educação em Platão não era formar o individuo para si mesmo, mas para a sociedade.
E esta sociedade, que se torna lugar apropriado para o exercício de uma educação integrada, a qual tem por base a busca tanto pela sua felicidade quanto pela de todos os outros indivíduos. Felicidade esta que se caracteriza sobretudo, pela real distinção entre o que de fato torna homem feliz.
Platão vai deixar claro que o homem quando educado, ele consegue estabelecer esta distinção, quando procura pautar-se numa vida virtuosa. E o que é ser virtuoso para Platão se não aquele que procura estabelecer um equilíbrio entre o prazer sensível corporal e a alma inteligível racional. A felicidade se encontra no justo equilíbrio entre estas duas realidades.
Platão estabelece a partir da sua alegoria da caverna, paradigmas de uma nova educação, alicerces para a construção de novas estruturas de pensamento. Onde estas novas estruturas representam também uma nova paideia antropológica. Como podemos ver, para Platão, o verdadeiro homem do Estado, o verdadeiro filósofo e poderíamos até mesmo afirmar: que o verdadeiro objetivo da educação em Platão é libertar o homem do seu mundo de sombras, imagens, ignorância, do seu mundo de apenas opiniões, para o mundo inteligível, o racional. Sair do mundo das trevas para o mundo da luz, o mundo da ciência.
A educação que é apresentada por Platão em sua alegoria da caverna, traz em si a grande característica de apresentar o problema da educação e apresentar o que é o homem e o que pode ser a partir da educação ou a da ausência dela. Platão trata da possibilidade do homem de conhecer a verdade das coisas e não apenas as imagens, a sombra. A educação como posse do conhecimento e da verdade, adquire esta possibilidade no pensador grego, ou seja, a educação possibilita ao homem de todos os tempos, uma purificação da alma por meio da contemplação do Bem Supremo.
A alegoria da caverna de Platão coloca em relevo a natureza humana e a sua relação com a cultura. A narrativa vai deixar expresso o caminho que o homem precisa percorrer para encontrar a luz, caminho este que feito somente a partir da educação. Então para o filósofo, a educação é caminho de libertação para o homem. Libertação de seus condicionantes culturais, sociais, político e também religiosos. É literalmente sair da caverna interior.
O próprio Platão em um dado momento explica a alegoria, apresentando esta trajetória que eleva a condição do homem á um outro nível do saber, que lhe advém pela educação.
Para Saber Mais
ABDALLA, Maurício, Um janela para a Filosofia. São Paulo: Paulus, 2004
FERNANDES, Damião, Conceito de Educação na Alegoria da Caverna no Livro VII da República de Platão, p.46-48
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