Saudade de José Américo
Por Francisco Cartaxo
O jornalista Sebastião Nery citou, em sua coluna do dia 4 deste mês (O que faz a diferença), publicada em jornais de diversos estados, trechos de livros, discursos e artigos de José Américo. Frases de efeito no melhor estilo do autor de A Bagaceira. Outras nem tanto, mas que encerram lição de conduta política. Ou de vida, ele que preencheu sua longa existência exercendo atividades de advogado, promotor de justiça, secretário no governo do presidente João Pessoa, revolucionário de 1930, mais tarde, ministro da Viação e Obras Públicas, senador e governador da Paraíba, ministro do Tribunal de Contas. Como escritor, memorialista sempre exaltado, foi pioneiro na ficção que abriu as portas ao regionalismo. Aposentado com honra de homem de bem. Dos 22 extratos selecionados por Sebastião Nery, transcrevo o de número 15:
“Só uma vez tentaram subornar-me. Foi como ministro do Tribunal de Contas. Um barbudo que tinha um processo para julgamento cochichou-me: “Dou-lhe um agrado”. Com a cara mais alegre deste mundo admiti a corrupção. “Aceito.” E, antes que ele metesse a mão no bolso, disse-lhe o que desejava: “Sua barba. Precisarei de uma vassoura para a limpeza da casa depois disso.”
Seco como a escrita de José Américo de Almeida, direto como os discursos do tribuno, e certeiro, Sebastião Nery fechou assim o artigo sob o tópico “Sarney”:
“Um foi governador. O outro também. Um foi senador. O outro também. Um foi escritor. O outro também. Um foi da Academia Brasileira de Letras. O outro também. Um se chama José Américo. O outro José Sarney. E é isso que faz toda a diferença.”
Que mais acrescentar? A palavra de uma se basta, cai em pé. Enquanto a do outro precisa escora. Causa nojo ver que o mau exemplo desce a ladeira e contamina os caminhos da democracia. Do planalto à planície. De tão disseminada, a gente chega a pensar que não é lama. Ainda que exale mau cheiro. Desce até nosso redor. Um forte estímulo ao uso descarado dos recursos públicos para formar patrimônio pessoal e familiar. Sinais exteriores de riqueza afloram na vizinhança. Patrimônio amealhado às expensas do “agrado” de que falou José Américo. E de muitos outros “agrados”.
Os corruptos debocham de todos nós. Resta o direito de sussurrar no boteco, na ante-sala do doutor, nas caminhadas diárias, em furtivos encontros de rua: o homem chegou puxando a cachorrinha e, de repente, ficou rico. Como é que pode? Eles desdenham, como faz Edmar Moreira, aquele deputado do castelo babilônico de milhões de reais. Milhões desviados dos cofres públicos por sinuosas fórmulas engendradas pelos “Agaciel Maia” da vida, os senhores dos “agrados” modernos, encarados com naturalidade na vida política brasileira. Nos parlamentos, em gabinetes públicos e privados, enfim, onde quer que se encontre alguém com a fraqueza e vulnerabilidade de José Sarney. E são muitos. E sem a firme convicção de um José Américo. Que são poucos. A elite de hoje está mais para o “galo velho” Zé Sarney, como Gonzaga Rodrigues o tratou, do que para José Américo de Almeida. Infelizmente.
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