Tarde de autógrafos? Tarde de agonia.
Só quem já publicou sabe os segundos angustiantes que antecedem o lançamento de um livro. No mínimo, você pensa que não chegará ninguém, que irá faltar luz, cair uma chuva torrencial, ou um aerólito despencará justo na hora e local do evento. Não adianta ter publicado e celebrado outras vezes, a cada lançamento esta tensão se renova.
Lembro bem de Lygia Fagundes Telles que relatou a tarde de autógrafos do seu primeiro livro. A escritora, à época desconhecida do grande público, descreve sua estreia em um dia de chuva e com “gatos pingados”, apenas sua tia, prima e algum colega compareceram, além de um jornalista misterioso do folhetim local. Assim também escreve Caio Fernando Abreu em uma crônica intitulada “Autógrafos, manias, medos e enfermarias”; na qual ele fala sobre a postura de alguns escritores nestas ocasiões de estreias: “Clarice Lispector apenas assinava seu nome. Érico Veríssimo autografava, mas dizia sentir-se constrangido como um camelô-de-si-mesmo”. Caio denomina esta ocasião como um “liquidificador emocional”.
Realmente, desde a divulgação até o momento ímpar do lançamento, não paramos fabular, imaginar cenas. Eu penso, por exemplo, que se nada der certo, eu canto Lennon e digo que sou hippie, que esta coisa de vender livros não interessa: vamos viver a poesia, gente! Mas, na verdade, uma gangorra brinca dentro de mim. De repente, quase na hora da estreia, o desodorante some, o sapato está sujo, a calça apertada, as canetas falham e a sensação de “seja o que Deus quiser” invade logo que avisto o primeiro convidado. Sorrio na foto, mas minhas pupilas acompanham tudo: será que todo mundo está bem servido, será que está demorando, será que está muito calor, será que faltaram cadeiras, será que o som está legal, será que alguém já foi embora antes da apresentação, será, será, será?
Interessante que na maior parte dos casos, o escritor é o que menos aproveita o evento, quando passa, bate aquela impressão: e agora, quem vai comer coxinha e conversar comigo? Que assim seja, o importante está na obra, na leitura pessoal. Eis que adoramos um embrulho, o meu com corações vermelhos e laços de fitas!
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