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Francisco Cartaxo

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Todo respeito à Constituição da República

27/04/2020 às 00h12 • atualizado em 27/04/2020 às 00h13

Constituição da República

Por Francisco Frassales Cartaxo

“Eu sou, realmente, a Constituição”, tossiu Jair Bolsonaro. Enquanto milhares de brasileiros adoecem e morrem, por causa do novo coronavírus, a autoridade que deveria comandar a luta, faz o quê? Faz intrigas. Incentiva apoiadores, com sua presença em improvisado comício, que ostentam faixas e cartazes instigando a tomada do poder pelos militares. Isso é lá presidente! No dia seguinte, tenta desdizer-se. O remendo sai pior do que o soneto: proclama-se a própria Constituição! Que arrogância! Quase repete a frase-símbolo do absolutismo, “O Estado sou eu”, atribuída ao rei da França Luís XIV.

O presidente Jair tem o costume de tentar apagar o que diz. Volta atrás, dá marcha à ré, como se obedecesse à ordem unida do meia-volta-volver! Ao dizer “Eu sou, realmente, a Constituição”, ele queria desfazer afirmação feita no domingo, perante devotos que portavam faixas pedindo o retorno do AI-5, o fechamento do Congresso e do STF. Um acinte à tática universal de evitar-se aglomeração de pessoas, num momento crucial do combate à pandemia da covid-19. Desrespeito a milhares de brasileiros que sofrem e morrem. Desrespeito à Constituição, ao chancelar, com sua irresponsável presença, atos contrários às instituições democráticas e ao estado de direito.

O capitão despreza o cargo e lições da história.

No passado, o general Eurico Gaspar Dutra jurou e cumpriu à risca a Constituição. Embora arrasado pelas desgraças da guerra, as forças aliadas comemoravam a vitória sobre o nazismo. Pouco antes, sob o Estado Novo, o Brasil namorara o Eixo Alemanha/Itália/Japão, mas terminou por incorporar-se à frente ampla que reunia as nações liberais da Europa, a Rússia e os Estados Unidos. Foi nesse clima, de exaltação das liberdades individuais e coletivas, que as elites brasileiras afastaram Getúlio Vargas do poder.

O Brasil renovou-se com o voto secreto.

Formados às pressas, os partidos apresentaram, no pleito de 2 de dezembro de 1945, candidatos a presidente da República. Com apoio de Vargas, o general Dutra derrotou o brigadeiro Eduardo Gomes. Dutra, ex-ministro da Guerra, no Estado Novo, governou respeitando as instituições e o estado de direito democrático. Sua arma era Constituição, promulgada em 18 de setembro de 1946. Conta-se que, quando ele tinha dúvida diante de decisões importantes, o presidente Dutra costumava indagar a assessores: o que diz livrinho? O livrinho era a Constituição. E não se afastava um milímetro das normas constitucionais. O Brasil viveu anos de tranquilidade.

Hoje o mundo é outro, bem sei.

O xadrez geopolítico é muito mais complexo, a base econômica é robusta, a sociedade brasileira abriga enorme diversificação e forte capacidade de reivindicações. A arte de governar, por isso mesmo, é muito mais exigente. Um aspecto, porém, não mudou. De um presidente da República se espera postura condizente com as responsabilidades do cargo que ocupa por força da vontade da maioria da população. Impossível aceitar-se conduta insana, inconsequente, sobretudo, quando se enfrenta terrível e inusitada situação causada pelo vírus mortal. Como se comporta Bolsonaro? O presidente não cumpre seu dever, que é o de comandar a luta contra a pandemia do novo coronavírus. É um ausente. Pior ainda, estimula com palavras e gestos concretos a insensatez de seus devotos. Acha pouco, e inventa essa de ser ele mesmo a Constituição. Isso é lá presidente!

Presidente da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL

Francisco Cartaxo

Francisco Cartaxo

Francisco Sales Cartaxo Rolim foi secretário de planejamento do governo de Ivan Bichara, secretário-adjunto da fazenda de Pernambuco – governo de Miguel Arraes. É escritor, filiado à UBE/PE e membro-fundador da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Autor de, entre outros livros, Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras no cerco ao padre Cícero.

Contato: [email protected]

Francisco Cartaxo

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Francisco Sales Cartaxo Rolim foi secretário de planejamento do governo de Ivan Bichara, secretário-adjunto da fazenda de Pernambuco – governo de Miguel Arraes. É escritor, filiado à UBE/PE e membro-fundador da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Autor de, entre outros livros, Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras no cerco ao padre Cícero.

Contato: [email protected]

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