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Gildemar Pontes

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Tristes trópicos

24/05/2017 às 21h25

Por Carlos Gildemar Pontes

Entender o sistema é tão necessário como aprender a somar. Não é nem um demérito saber ler, formar-se, passar em concurso, partilhar o conhecimento. Muitos fazem isso até como profissão, caso legítimo dos professores. Então, é a escola o lugar mais importante para alcançar o conhecimento, a compreensão do mundo e dos sistemas.

No Brasil, desde a chegada dos portugueses, para tomar posse, vivemos ilhados. São enormes distâncias físicas e de privilégios de informação. Tivemos a “ilha” de Salvador, de Vila Rica, do Rio de Janeiro, sempre atreladas ao desenvolvimento da colônia pelo comércio para a matriz. Só depois de Brasília, é que esse centro de poder ficou cada vez mais distante do povo, do cidadão comum. Instituiu-se a regra sórdida de quanto mais próximo do poder mais distante do povo. E, assim, foram construindo riquezas familiares, castas de privilégios, donos de cargos e mandatos que consolidam famílias e enobrecem sobrenomes. O povo, que vota em toda eleição, já não o faz mais por convicção em programas ou projetos políticos, mas pela troca de benefícios, muitas vezes, migalhas que humilham, porque, antes, já destituíram a cidadania.

As escolhas de quem vai governar também acontecem pelos interesses do poder econômico. O poder se adapta para estar sempre por cima. Depois dos militares, o poder escolheu Tancredo, porque era mais palatável junto aos movimentos de neolibertação do Brasil. Tancredo (morreu?) não vingou, mas seu vice, um dos grandes aliados do sistema saprófito, em que circula a podridão do sistema contaminado pela corrupção, assumiu o cargo. José Sarney foi um presidente tão pernicioso que sequer melhorou seu estado, o Maranhão, um dos mais pobres do Brasil. Depois veio Collor, o deposto, um corrupto boçal típico dessas republiquetas de bananas. O vice, tampão, era socialmente festeiro, mas sem projetos para o país. Aí veio o FHC, o intelectual da USP, o que dominava línguas e falava em inglês na ONU.

Seguiu a cartilha do Banco Mundial e quase quebra o país, implementando a ideia do Estado Mínimo, num país sem estrutura nas áreas de saúde, educação, segurança e sem nenhum projeto desenvolvimentista. Resultado: o país se distancia dos grandes centros tecnológicos, abrindo as portas para a indústria estrangeira, em detrimento do desenvolvimento da indústria nacional. A era Lula parecia que iria redimensionar os rumos dispersos do governo anterior. E conseguiu avançar na política social de inclusão, mas avançou, mais ainda, na política de benefícios aos rentistas internacionais e nacionais, especialmente a banqueiros e empreiteiros. Essa aproximação foi fatal para o projeto (socialista?) de diminuir a distância entre pobres e ricos. Se conseguiu minimizar a miséria, aproximou do poder toda a espécie de parasita do sistema. E quem controla o sistema num país sem educação são os donos do poder.

O deslumbramento de Lula com o poder, a aquiescência com o caixa 2 e com a formação de grupos de aliados nada ortodoxos, num sistema que se queria socialista, minou gravemente a compensação social que foi dada em seu primeiro governo. Sua sucessão, através da primeira mulher presidente foi um desastre. Preocupada em não deixar avançar a corrupção, que foi alimentada no governo Lula com a chegada ao poder do PMDB e nanicos parasitas, Dilma Roussef quis engrossar uma resistência ao modelo neoliberal, assumido por Lula, e que avançava para a retirada de direitos dos trabalhadores, mas a grilagem política já havia se instalado. Resultante disto, Operações da Polícia Federal e Ministério Público revelavam o maior esquema de corrupção de um país com histórico de ter sido a quinta ou sexta economia do mundo. O sistema não perdoou a desobediência da presidente(a) e trocou-a por um canalha da pior espécie que já assumiu essa república. Temer, vice escolhido pela cúpula do PT, tornou-se inimigo nacional. Escolheu um grupo de corruptos de confiança e promoveu uma devassa nos direitos trabalhistas.

E não diferencio aqui corrupto de partido “A” ou “B”, de ontem ou de agora. Todos são igualmente abjetos. Tristes trópicos, como diria Lévi-strauss, que abriga socialistas e capitalistas, negociando projetos e favores, como se fossem pauta da vontade do povo. Essa conivência entre lobos e cordeiros, comandados pelo dono dos porcos, conseguiu dividir um povo que torce pelo mesmo time, frequenta a mesma praia, comemora os mesmos símbolos, embora guardando suas virtudes e defeitos, mas, agora, divididos pelo ódio. Enquanto “coxinhas” e “mortadelas” se estranhavam nas redes sociais e nas ruas, os fabricantes de coxinhas e mortadelas colocavam papelão e propina na barriga do povo, com a conivência espúria dos representantes dos dois: parlamentares do PMDB, PSDB, PT, PP, DEM, PSC… que se banqueteavam em nome dos eleitores trouxinhas.

Como entender esse jogo complexo do sistema? Como permitiram Lula? Permitiram, desde que levasse junto os manipuladores do sistema. Por que erramos nas escolhas de deputados, senadores, governadores, prefeitos e vereadores? Porque na eleição os discursos se confundem e para chegar ao poder se negocia com Deus e o diabo ao mesmo tempo. E agora, o que fazer? Ainda dá tempo estudar. Cansa, dá sono, a preguiça enevoa o livro, mas não há outra saída. Um povo criativo, bonito e trabalhador não pode ser taxado tão pobremente de trouxinha.

Gildemar Pontes

Gildemar Pontes

Escritor e Poeta. Ensaísta e Professor de Literatura da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, em Cajazeiras. Graduado em Letras pela UFC, Mestre em Letras UERN. Doutorando em Letras UERN. Editor da Revista Acauã e do Selo Acauã. Tem 22 livros publicados e oito cordéis.

É traduzido para o espanhol e publicado em Cuba nas Revistas Bohemia e Antenas. Vencedor de Prêmios Literários locais e nacionais. Foi indicado para o Prêmio Portugal Telecom, 2005, o principal prêmio literário em Língua Portuguesa no mundo. Ministra Cursos, Palestras, Oficinas, Comunicações em Eventos nacionais e internacionais. Faixa Preta de Karate Shotokan 3º Dan.

Contato: [email protected]

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Escritor e Poeta. Ensaísta e Professor de Literatura da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, em Cajazeiras. Graduado em Letras pela UFC, Mestre em Letras UERN. Doutorando em Letras UERN. Editor da Revista Acauã e do Selo Acauã. Tem 22 livros publicados e oito cordéis.

É traduzido para o espanhol e publicado em Cuba nas Revistas Bohemia e Antenas. Vencedor de Prêmios Literários locais e nacionais. Foi indicado para o Prêmio Portugal Telecom, 2005, o principal prêmio literário em Língua Portuguesa no mundo. Ministra Cursos, Palestras, Oficinas, Comunicações em Eventos nacionais e internacionais. Faixa Preta de Karate Shotokan 3º Dan.

Contato: [email protected]

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