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Mariana Moreira

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A tristeza do cartaz

18/02/2023 às 08h26 • atualizado em 18/02/2023 às 08h27

Coluna de Mariana Moreira - foto: Lalo de Almeida/Folhapress

Por Mariana Moreira – A primeira informação sobre os yanomamis vejo em um cartaz na parede do Centro Acadêmico Vladimir de Carvalho, do Curso de Comunicação Social da UFPB. Isso, nos primeiros anos da década de 1980. O cartaz já denunciava as ameaças que pairavam sobre estes povos, sobretudo, com as ações governamentais, empreendidas pelos governos ditatoriais, sinonimizadas na construção da transamazônica, na abertura de fronteiras agrícolas, no estímulo financeiro e na isenção fiscal como elemento sedutor para atrair os investimentos estrangeiros.

E hoje, quando os noticiários escancaram a gravidade da situação dos yanomamis, com letais quadros de desnutrição, de adoecimento provocado pelo envenenamento das águas de seus rios, de morte por fome em razão do avanço da atividade ilegal da pecuária e do garimpo que destrói florestas e fontes de alimento, o rosto daquele índio representado no cartaz da parede do Centro Acadêmico se confunde com corpo esqueléticos, olhos opacos e vozes sussurradas dos que, hoje, desenham rabiscos de gentes nas telas de TV.

Como outrora, hoje também a questão dos yanomamis, e de tantos outros grupos de povos originários, que definham e trilham o inexorável caminho da extinção, é tratada como uma situação pontual, decorrente da omissão de um governo irresponsável e genocida.

É claro que a omissão governamental agudizou a situação dos yanomamis e de outros grupos. Mas, a destruição dos povos originários no Brasil deve ser suspensa à condição de política de Estado. Os financiamentos e subsídios públicos para a atividade pecuária e agrícola na região amazônica, a retaguarda de poderosos grupos econômicos que sustentam e financiam a mineração depredatória, camuflados em instituições e empresas de “ilibada” reputação, a atividade comercial que financia a extração e compra de ouro e pedras preciosas, que ornarão luxuosas e caríssimas joias expostas em requintadas vitrines e delicados pescoços em shoppings e banquetes. Tudo isso soma e dar personalidade legal a atividade econômica que se sustenta como um importante tentáculo do sistema capitalista.

Mas, os noticiários mostram apenas minguados garimpeiros e suas rudimentares bateias como os verdadeiros e únicos responsáveis pela tragédia dos yanomamis. Eles são apenas o elo mais frágil dessa cadeia e, portanto, o que tem menos poder de força para se camuflar e ser diluído na propaganda do desenvolvimento, do progresso, da modernidade.

E o rosto do yanomami no cartaz vai muito além da tragédia atual, revelando a verdadeira proporção da perversa e duradoura ação de extinção de povos, costumes, modos de vida, simplesmente porque suas vidas e histórias nada valem ante uma pepita de ouro e uma cabeça de gado.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Mariana Moreira

Mariana Moreira

Professora Universitária e Jornalista

Contato: [email protected]

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