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Damião Fernandes

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Cajazeiras da exclusão: e os pobres onde moram?

30/03/2017 às 08h25 • atualizado em 30/03/2017 às 08h27

A cidade de Cajazeiras tem sonhos de gente grande, de cidade grande. Cajazeiras tem pretensões de ser uma cidade europeia. Sob aureolas de títulos pomposos, autorreferentes e presunçosos, que mais demonstram um tipo de patologia desfocal de identidade, quem sobre da grave ausência de um autoconhecimento plausível, moderado e honesto.

Cajazeiras, grita aos quatro quantos dos sertões paraibano, que somente ela se configura nesses mais de 100 anos de emancipação, como a cidade que ensinou a Paraíba a ler. Veja bem, ela não se satisfaz em sentir-se uma cidade entre tantas outras, que tiveram suas contribuições com o desenvolvimento cultural local, econômico e político-social de uma determinada região ou micro região. Com ar de autorreferente metrópole do Sertão, Cajazeiras é a cidade que mesmo estando geograficamente num entre polo educacional, mesmo assim ela se revela como uma cidade sem senso crítico sobre si mesma e que sobrevive da tentativa de alimentar os seus mitos de origem fundacional, seus mitos de protagonismo político e sobretudo, os seus mitos de homens vivos e heróis, como forma de manter um status quo de aparato ideológico-patriarcal e um espirito religioso-pietista-devocionista.

Tal espirito religioso, revela-se no profundo sentimento de um pietismo vazio e devocionista, onde é possível perceber nas diversas manifestações religiosas-culturais que são produzidas aqui na terra da cultura como também nos comportamentos individuais de vivência da sua fé individual. Um pietismo-devocionista que é muito bem vivido dentro de um espaço convenientemente religioso, mas que é esquecido e até colocado à margem, quando esse mesmo indivíduo se encontra fora, no mundo milenar profano. Ou seja, em Cajazeiras, há uma mentalidade religiosa devocionista que se relaciona muito com uma prática de descriminação e segregação das pessoas pobres, que exclui e trata com profunda indiferença a cada um deles. A cada um que não comunga das mesmas ideias patriarcais, seletistas, demagógicas e oportunistas. Esse espirito religioso não se inquieta com a contradição entre pensamento e ação, fé e obras, evangelho e vida. A atitude indiferente com os pobres é dogma religioso desse tipo de devocionismo vazio.

Falando em pessoas pobres, onde elas estão? Onde elas moram? Em cajazeiras, as pessoas pobres (mendigos e/ou pessoas de rua) foram transformados em objetos decorativos, semelhante quando você passa nas praças e observa os bancos, os postes, as luzes, as arvores e passa adiante, da mesma forma é a atitude quando nessas mesmas praças vemos, misturados com a decoração, tantos mendigos ali alojados, passamos adiante.

Quando achamos que não é suficiente tal indiferença, cortamos as arvores sob as quais tinham seu inadequado lugar de repouso. Onde eles moram? Na calçada e na praça da Igreja Catedral? Na calçada da Rodoviária? nos sinais de trânsito? Em prédios abandonados? Perambulando pela cidade com seu papelão em baixo do braço? Talvez em todos em esses lugares e nas diversas maneiras. Mas quem os vê? Quem os olha? finge que existem?

“O que sentimos no coração quando caminhamos pela rua e vemos os sem-teto, vemos as crianças sozinhas que pedem esmola. ‘Esses são daquela etnia que rouba’. E sigo em frente. Faço assim? Os sem-teto, os pobres, os abandonados, e até mesmo os sem-teto bem-vestidos, que não têm dinheiro para pagar o aluguel porque não possuem trabalho. O que eu sinto? Isto faz parte do panorama, da paisagem de uma cidade, como uma estátua: na parada de ônibus, nos Correios. Os sem-teto fazem parte da cidade? É normal isso? Fiquem atentos! Fiquemos atentos! Quando essas coisas em nosso coração passam como normais, quando penso: ‘mas a vida é assim, eu no entanto, como e bebo, e para tirar-me um pouco o sentimento de culpa dou uma oferta e sigo em frente.

Se penso assim, este caminho não é bom.” (Homilia do Papa Francisco na missa celebrada na manhã do dia 16/3.2017 na Casa Santa Marta, Roma)

Cajazeiras é uma cidade que trata mal os seus pobres. É uma cidade que se acha muita coisa, mas que não enxerga cada homem, mulher, criança e idoso que sofrem por essas ruas frias e vazias. Não promove dignidade para nenhum deles. Pelo contrário, os exclui do seu direito humano mais básico: o direito de ser notado. Para a cidade da cultura, as centenas de moradores de rua, mendigos e pedintes, são perfeitamente invisíveis. Portanto, aquilo que ninguém vê, não existe.

Cajazeiras é uma cidade que se sente metrópole mas que é profundamente indiferente à periferia que vive ou sobrevive no seu centro, em suas ruas e avenidas. È uma cidade que promove o glamour das famílias de famílias ricas e tradicionais como forma sustentar os mitos de origens de seus bens, mesmo que muitas das vezes, tenham que depender da ação sacerdotal de políticos corruptos, corruptores, ladrões e pedófilos, que se intitulem promotores de um progresso econômico para a sociedade e de bens culturais para a grande massa. Cajazeiras é uma cidade necessitada de nova medula político-social, cultural e religiosa, pois a que tem já está à muito tempo necrosada.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Damião Fernandes

Damião Fernandes

Damião Fernandes. Poeta. Escritor e Professor Universitário. Graduado em Filosofia. Pós Graduado em Filosofia da Educação. Mestre e Doutorando em Educação pela (UFPB). Autor do livro: COISAS COMUNS: o sagrado que abriga dentro. (Penalux, 2014).

Contato: [email protected]

Damião Fernandes

Damião Fernandes

Damião Fernandes. Poeta. Escritor e Professor Universitário. Graduado em Filosofia. Pós Graduado em Filosofia da Educação. Mestre e Doutorando em Educação pela (UFPB). Autor do livro: COISAS COMUNS: o sagrado que abriga dentro. (Penalux, 2014).

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