Crise econômica é de todos
Por Francisco Cartaxo
No começo parecia que a crise era deles. Só deles. Dos americanos. Lula chegou a brincar com o presidente, olha Bush, resolva logo seu pepino aí… Lembram-se? Parecia “marolinha”… Hoje não há lugar para brincadeiras. O cenário está mais claro. Mais claro para ver nas sombras o mundo em desgraça. No mundo encurtado pela tecnologia, a interdependência entre os fatos e entre os povos é tão intensa que não dá para construir cercas nas fronteiras nacionais, aliás, abolidas há muito tempo pelos tentáculos das corporações transnacionais. Portanto, impossível pensar que a crise se restringiria ao lugar onde nasceu e explodiu. Ou que pudesse limitar-se a alguns poucos infelizes. No início era difícil enxergar seu tamanho e prever como se espalharia. Aliás, ninguém o fez. Nem mesmo os especialistas mais bem dotados.
Agora está mais fácil ver o desastre. Avaliar corretamente, ainda não. Só mais adiante, mas já é possível traçar um roteiro para entender o que se passa no mundo. Por mero artifício didático, divido a trajetória da crise em cinco faces. Primeira, a financeira, por onde a crise nasceu no estouro dos empréstimos lastreados em hipotecas imobiliárias de alto risco (subprime), transformadas em atraentes títulos no mercado americano, que passaram a correr o mundo na calda dos bônus milionários… O estouro arrasta bancos e afins, levando à escassez de crédito. Segunda, no passo seguinte, a crise torna-se econômica, os efeitos negativos alcançam o mundo real, empresas do setor produtivo e famílias passam a ter menos grana para comprar bens e serviços. Terceira – menos dinheiro na mão dos consumidores resulta em queda na produção de bens e serviços causando desemprego, a face mais perversa da crise. Quarta, a retração da atividade econômica implica em menor arrecadação de impostos e, por conseqüência, na capacidade de gasto do setor público. Quinta, menos recursos financeiros circulando, trabalhadores desempregados geram insatisfação coletiva, com forte possibilidade de reação política com reflexos eleitorais.
A seqüência não é linear nem perfeita. Cada passo se inter-relaciona com o outro, da mesma forma que os remédios aplicados pelos governos. Os Estados Unidos tentam estatizar o que resta do seu sistema financeiro, enquanto estimulam o mercado de imóveis e abrem os cofres do seguro-desemprego, que já abriga mais de cinco milhões de beneficiários! O PIB do Japão deve retrair-se quase 6% este ano, isto é, crescer para baixo como rabo de cavalo. A União Européia navega em marcha lenta, tentando conciliar os interesses divergentes dos países membros, em meio a prenúncios de caos social, com greves de trabalhadores já pipocando na França. A China, que está às voltas com 20 milhões de desempregados, tenta manter seu alto crescimento, entre outras razões, para evitar um desastre ainda maior na economia dos Estados Unidos. Por quê? Porque os chineses detêm um trilhão de dólares em títulos do tesouro americano. (Não está errado, é isso mesmo um trilhão!) Outros emergentes (Brasil, Rússia, Índia, México, Indonésia, África do Sul) e países menores estão no mesmo barco, procurando saída para a crise que é de todos. Não existe ilha econômica no planeta. E há terra à vista?
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