Manter o curso de medicina: desafio de todos
O curso de medicina de Cajazeiras não será extinto. Um sonho de muitos anos, uma conquista de todos não se esvai assim, sem mais nem menos. Avaliações enviesadas, pedido de impugnação fora do contexto regional ou coisas que o valham servem para fortalecer a necessidade de mantê-lo. Manter e melhorar. Nunca para eliminá-lo. Existem razões estratégicas, fortes e corretas, para que a assertiva seja verdadeira. Razões estruturais, diferentes das alegações até agora apresentadas para respaldar indesejável extinção do curso com seis semestres de funcionamento.
A decisão de abrir o curso de medicina da UFCG, campus de Cajazeiras, não nasceu por acaso. Por trás da deliberação do MEC há motivos relevantes, entre os quais, a estratégia de interiorizar o ensino superior, um elo forte do programa de desenvolvimento econômico, tecnológico e social do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, inserido no objetivo de reduzir os desequilíbrios regionais, presentes desde muito tempo na sociedade brasileira. Tanto é que, nos últimos seis anos, foram criadas dezenas de universidades e centenas de cursos, a maioria fora das Regiões Metropolitanas, muitos deles no Nordeste.
Executar um programa de tal envergadura não é um mar de rosas. Ao contrário, é tarefa dificílima. Nada, porém, que não possa ser enfrentado. E resolvido. Faz parte do pioneirismo de qualquer empreendimento, em especial, quando se quebra paradigma. E um operário, pouco letrado, quebrou paradigma. Coisa que o professor Fernando Henrique Cardoso não fez.
E as dificuldades atuais? São muitas. Algumas nascem e prosperam no interior da UFCG: carência de professores, deficiência de instalações apropriadas, ambiente para aulas práticas, campo de estágio e outras e outras e outras. Dessas dificuldades, aliás previsíveis, não me arrisco a falar agora, salvo para deixar meu depoimento acerca d e um ponto: o esforço desenvolvido para fazer do Hospital Regional de Cajazeiras um lugar decente e adequado ao treinamento dos estudantes da área de saúde. Tarefa dificílima, sobretudo, porque exige a remoção do costume de usar o HRC com objetivos eleitorais. E nem sempre os atores institucionais responsáveis pela gestão tripartite se conformam com isso.
Compete à direção do campus assumir as responsabilidades de aprofundar o debate interno e fazer os encaminhamentos devidos junto à UFCG. Ou procurar apoio na comunidade, quando for o caso. A mesma comunidade que ajudou, e muito, na micro-decisão de localizar o curso em Cajazeiras e não em outro campus.
Vejamos agora dificuldades de outra natureza, a respeito das quais a responsabilidade do mundo acadêmico é bem menor, senão inexistente. E aqui o assunto extrapola o curso de medicina e o próprio campus para alcançar o processo de transformação de Cajazeiras em cidade universitária. Portanto, tem tudo a ver a gestão pública e com o dinamismo da iniciativa privada. Um problema que salta aos olhos é sem dúvida a inadequação da oferta de moradias, de vias de acesso e circulação, de disciplina no trânsito, de hotéis, restaurantes, lanchonetes e similares à demanda criada em função da afluência de milhares de estudantes de outras cidades e de estados vizinhos. O caso mais gritante é o da oferta de apartamentos para abrigar a rapaziada que precisa de acomodações e tranqüilidade para dedicar-se aos estudos, objeto de sua mudança de residência. Isso não se faz da noite para o dia, pois implica numa alteração no padrão de construção imobiliária. Reconheça-se, a cidade não estava preparada. Nem podia estar. Aqui se configura uma situação típica em que a oferta é induzida a fórceps pela demanda. Por isso, engatinha, apesar do avanço já observado na qualidade dos prédios em construção, em novos hotéis e restaurantes.
Os desafios postos ao gestor público municipal têm outra dimensão. O primeiro é ter consciência da urgente necessidade de Cajazeiras ordenar seu crescimento urbano global, tendo como referenciais básicos os centros de ensino superior, técnico e profissionalizante, na medida em que esses equipamentos funcionam como pólos modificadores da configuração urbana da cidade. A segunda dimensão diz respeito à capacidade de articulação que o poder público deve, necessariamente, desempenhar. Articulação vertical, no âmbito do setor público, envolvendo os outros níveis federativos (estado e União) e, também, articulação horizontal, assumindo o próprio gestor a missão de congregar os agentes econômicos e políticos na mesma luta de acelerar o processo de adequação de Cajazeiras à nova condição de cidade universitária em formação.
Tudo isso é necessário e urgente para consolidar o curso de medicina que não será extinto nem agora nem nunca. Acautelem-se os que raciocinam em função de projetos imediatos, distantes do contexto econômico, social e político determinante da expansão do ensino superior rumo às áreas mais pobres do território brasileiro. Acautelem-se e ajudem. Ou, pelo menos, não atrapalhem.
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