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Damião Fernandes

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O intelectual e a mentira

29/09/2008 às 14h10

Em toda sociedade, ou em quase todas, há homens e mulheres cuja função social é a de ‘intelectual’: escribas, padres, professores, quadros técnicos ou científicos, escritores, pesquisadores etc. Mas para que haja ‘intelectuais’, no sentido estrito do termo, é necessário que nessa sociedade exista um espaço público. 

O intelectual é aquele que engaja sua competência particular para dar-lhe um sentido universal, é aquele que usa a autoridade do seu saber para dele fazer uma autoridade moral, é aquele que produz idéias com fatos e não apartir de vazias averiguações politicóides e aventureiras como ora estamos a presenciar em Cajazeiras. Homens ditos “intelectuais”,usam de palavreados emancipados em defesa da honra, da ética, de valores sócias “históricos”. Mas que na verdade o que pretendem é induzir a consciência das pessoas em nome de uma pretensa novidade histórica: A elegibilidade de um afro-descendente.

Mas, em nome de quê, o intelectual toma a palavra contra ‘o poder’ ou favor do ‘poder’? Em nome de seu saber? É certo que o saber liberta, se comparado à ignorância ou à superstição. É o que todos os intelectuais ‘progressistas’ sempre proclamaram e proclamam. Mas é preciso muita atenção: É grande o risco de que esse saber seja instrumento de outro poder e acrescente o peso de sua própria dominação às servidões que ele pretende golpear: é o ‘poder simbólico’ dos intelectuais que Pierre Bourdieu não cessou de denunciar. Essa dialética entre o saber do poder e o poder do saber ecoa no primeiro conflito ‘intelectual’, no século 5 a.C. na Grécia: de um lado, os sofistas, grandes defensores das luzes, que submetiam os mitos e as crenças a uma feroz crítica racionalista; de outro, Sócrates, que denunciava as pretensões políticas dos sofistas e todos os verdadeiros poderes de falsos saberes: o que é um saber que nem mesmo consegue dar conta de si mesmo?, ironizava ele.

O que é um saber que se sujeita á estar a serviço de uma determinada ideologia política? Onde muitas vezes essa mesma ideologia ou seus ideólogos tem se mostrado fanfarrões, medíocres e sensurante da vontade individual das pessoas? Verificamos que a possibilidade de intelectuais estarem atrelados a certas estruturas políticas dominantes com o claro objetivo de justifica-las e serem seus avalistas é absolutamete possível. Isso é comprovadamente possível. A historiografia está aí para provar.

Na “cidade que ensinou a Paraíba a ler”, como insistem em afirmar, presenciamos a tentativa de homens da letra, do ‘saber’, de uma intelectualidade serviçal, levantarem a bandeira da liberdade racial quando na verdade estão levantando sua bandeira político-partidária, levantando a bandeira de suas opções políticas. Não que eu tenha nada contra sua opções políticas, até por que todos nós, somos livres para escolhermos quem queremos, somente não somos livres para fazer uso de um saber, para induzir as pessoas a escolherem por nossos canditados e lavantarem nossas bandeiras individuais. Um comportamento ético de um intelectual sério e comprometido com a verdade das coisas e dos fatos seria o comportamento da imparcialidade, da neutralidade enquanto ser político. A voz do intelectual compromissado com a verdade fala para todos.

Para poder falar a todos, é preciso que o intelectual abra mão de seus objetos particulares (literatura, filosofia, ciência, escolha política) e possa falar de tudo a fim de defender os valores universais (justiça, verdade etc) e não seus valores individuais. Como disse Sartre, o intelectual é em primeiro lugar ‘aquele que se mete naquilo que não é da sua conta’. Mas por que teria ele, mais do que outro, o direito de falar? À impossibilidade dessa pretensão totalizante de Sartre, Foucault opôs a modéstia do ‘intelectual específico’ que fala a partir do lugar que ocupa e não em lugar dos outros. Mas sobre quais valores partilhados por todos pode ele fundar sua ação? Das duas concepções de intelectual, o antagonismo de Sócrates e dos sofistas já é exemplar. 

Aos intelectuais que de forma emancipada de qualquer cor politico-partidária, étnica, religiosa ou social contribuem com sua reflexões singulares, oportunas e corajosas os nossos parabéns. E aos "intelectuais" serviçais,  que por ventura são manobrados por seus interesses ou interesses de qualquer um outro grupo político, social, etnico ou até mesmo religioso, o nosso sentimento de repúdio e rejeição.

Para saber mais

Chauí, M. O Que é Ideologia. São Paulo: Brasiliense.
Mannheim, K. Ideologia e Utopia. Rio de Janeiro: Guanabara.


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Damião Fernandes

Damião Fernandes

Damião Fernandes. Poeta. Escritor e Professor Universitário. Graduado em Filosofia. Pós Graduado em Filosofia da Educação. Mestre e Doutorando em Educação pela (UFPB). Autor do livro: COISAS COMUNS: o sagrado que abriga dentro. (Penalux, 2014).

Contato: [email protected]

Damião Fernandes

Damião Fernandes

Damião Fernandes. Poeta. Escritor e Professor Universitário. Graduado em Filosofia. Pós Graduado em Filosofia da Educação. Mestre e Doutorando em Educação pela (UFPB). Autor do livro: COISAS COMUNS: o sagrado que abriga dentro. (Penalux, 2014).

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