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Abraão Vitoriano

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Prazer, sou estranho

14/09/2015 às 19h56

Prazer, sou estranho. Levo uma vida distante dos manuais de etiqueta e dos códigos sociais mais conservadores. Não penso em casar, em constituir família. Não nasci para ter e criar filhos. Ao passo que não me vejo no dever de estar com alguém a não ter que ficar só. A solidão, a despeito do que imaginam, não me assusta. Sou um solitário assumido, um romântico reincidente, um carente profissional. Contudo, isto não tira o meu bom senso, não fico esperando na janela o Amor passar, quero dizer, nem sempre. Assumo minha incapacidade diante de certas questões da vida e se parecer frágil, eis mais um traço da minha personalidade, que também se dinamiza, que também se abastece de contradições. Aliás, amo paradoxos e hipérboles. Amo o poder de ser rio e não carregar o peso de velhas convicções. Repito palavras e lamentos. Troco vírgulas por dois pontos, travessão por parênteses. Gosto de tomar banho com a luz apagada. Não me esforço para entender futebol. Penso que gosto se discute. Analiso informações antes de petrificar verdades. Gosto do silêncio e do perfume dos livros, eles têm um preço que uma calça de marca jamais poderá me dar. Para ser franco, não ando na moda, não combino sapato com camisa, muito menos evito reprisar peças por medo de alguém me considerar simplório ou brega. Ser brega é outra coisa que aprecio, brega por ainda acreditar na humidade, brega por acreditar nas pessoas e meter a cara na parede, brega por pedir o mesmo prato no cardápio, brega por ouvir músicas antigas e retirar os móveis da sala para dançar. Por outro lado, sou quase um marciano em festas populares, nas quais todos o cantam o Safadão e eu prossigo a mascar os chicletes; nas quais todos se paqueram e eu tropeço e derramo água nas pessoas. Desisti deste jogo de sedução, sou péssimo em seduzir com meu andar desajeitado, com minhas respostas e perguntas filosóficas, com minha timidez de não saber onde enfiar as mãos, ou tentar sorrir e acharem que estou chorando. Nada disto me incomoda. Maior a minha capacidade de rir de mim, até nos contratempos. Sou bizarro pelas horas que fico olhando para o nada, por criar histórias com desconhecidos que apenas observo de longe. Sou anormal, porque discordo de determinadas posturas, não ensaio santidades e não sou o primeiro a receber a hóstia para chamar mais atenção. Sou estapafúrdio quando exerço a minha liberdade de também errar, não ambicionar ser perfeito, descartar ascensões que não são minhas. Sou enigmático, graças à beleza do óbvio: a natureza é uma máquina de invenções, quero aproveitar até o último segundo. Sou insólito, sou de amores imperfeitos, ausências que costuram, beijos e lágrimas. Sou extravagante: se for para chutar o pau da barraca, não titubeio; levanto, limpo a roupa e endureço o pescoço. Noutras ocasiões, apenas calo. Assim como Clarice foi obrigada a se aceitar, assim como Manoel escreveu que tudo o que não inventa é falso: sou uma gramática sem normas, palavras conjugadas no verbo da vida. 

Abraão Vitoriano

Abraão Vitoriano

Formado em Letras e Pedagogia. Pós-graduado em Educação. Escritor. Poeta. Revisor de textos. Professor na Faculdade São Francisco da Paraíba e na Escola M. E. I. E. F Augusto Bernadino de Sousa.

Contato: [email protected]

Abraão Vitoriano

Abraão Vitoriano

Formado em Letras e Pedagogia. Pós-graduado em Educação. Escritor. Poeta. Revisor de textos. Professor na Faculdade São Francisco da Paraíba e na Escola M. E. I. E. F Augusto Bernadino de Sousa.

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