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Mariana Moreira

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 Secas e Lições

24/02/2024 às 13h12

Imagem ilustrativa - Foto: Agência Brasil

Por Mariana Moreira – A irregularidade das chuvas caídas na região nos primeiros meses do ano confirma as previsões de especialistas que, em estudos e relatórios, anunciam a ocorrência do fenômeno El Nino, cujo registro, com regular periodicidade, tem como consequência a incidência de fortes temporais em regiões do Sul e Sudeste e escassez de chuvas no Nordeste, sobretudo, em sua região semiárida.

Ora, mas a ciência já acumula saberes que permitem, com alta margem de segurança, previsões da ocorrência, ou não, de estiagens. A ciência, inclusive, quando se alia com o conhecimento popular, produze e acumula saberes que, nas últimas duas décadas conseguem trazer profundas mudanças físicas, políticas, culturais e humanas ao sertão e aos homens que, vivendo nesta região por séculos, sofriam e sofrem os clamores das secas e, sobretudo, de sua manipulação, por grupos dominantes, em poderosa ferramenta de poder político.

Saberes traduzidos nas cisternas de placa que, espalhadas aos milhares em oitões de casas por tantos sertões, acumula, em média, dezesseis mil litros de água, recomendada para consumo humano, sobretudo, nos períodos de estiagens. Cisternas que, desde sua concepção, trazem como principal benefício o saber pedagogicamente construído com a participação da família. Cisternas que, iniciadas por ação e atuação de pastorais da Igreja Católica, sindicatos, associações comunitárias, movimentos sociais, tem seu planejamento e execução transcorrido com a discussão da comunidade e das famílias beneficiadas, desconstruindo, assim, uma prática política traduzida na “indústria da seca” e que, historicamente, privilegiou alguns minguados e condenou milhares ao degredo, a fome, ao desterro.

Cisternas que não apenas alteram a paisagem física, mas sobretudo, transformam vidas e futuros. Assim, as estatísticas comprovam o que os estudos científicos apontam: a drástica redução dos índices da mortalidade infantil que, em décadas recentes, colocavam o Nordeste na trágica liderança das mortes infantis por diarreia e outras complicações advindas do consumo de água contaminada.

Além das cisternas para o consumo humano, a aliança ciência e sabedoria popular espalhou pelos sertões semiáridos as tecnologias sociais traduzidas nas cisternas calçadão, das barragens subterrâneas, da preservação da caatinga como um bioma fundamental para a continuidade da vida na região.

Mas, tudo isso somente ganha sustança quando, por pressão popular, são criadas e executadas políticas públicas que, democraticamente gerenciadas, espalham benefícios para todos. Políticas que, no nascedouro, foram abortadas por golpes, por retrocessos políticos, por atrofias do terraplanismo. E que, minimamente, superadas as adversidades, carecem ser retomadas para buscar consolidar as mudanças e, assim, todos entoarem, em melodia, uma nova canção do hoje:

Você ainda vai lembrar que a seca volta

E vai lembrar do velho dito popular

“É bem melhor se prevenir que remediar”

Zele os barreiros, os açudes e as aguadas

Não desperdice sequer uma gota d’água!”

(Água de chuva – Roberto Malvezzi, Gogó)


Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Sistema Diário de Comunicação.

Mariana Moreira

Mariana Moreira

Professora Universitária e Jornalista

Contato: [email protected]

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