Biografia do padre Ernando Teixeira

Por Francisco Frassales Cartaxo – Subo a leve rampa na entrada da casa onde nasci. Árvores frondosas, pés de carnaúba parecem palmeira imperial, o vento brinca de chover nas palhas do coqueiro, bem-te-vis fazem chacota cantante, o grito do tetéu inunda o ar onde voam rolinhas caldo-de-feijão com pequenos gravetos para o ninho! Busco minha mãe. A porta do corredor, cheio de livros de meu pai, me leva à cozinha. Entrei.
Entrei. Um gênio carinhoso e amigo,
O fantasma talvez do amor materno,
Tomou-me as mãos – olhou-me grave e terno
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E, passo a passo, caminhou comigo.
Sentada na cabeceira da mesa de madeira maciça, dona Belinha logo pediu café quente à velha Totonha, marcada de vincos dos ancestrais escravizados, nascidos no sítio Prensa, no tempo Mãe Nanzinha, minha avó. Herança de José Antônio do Couto Cartaxo, o primeiro filho do primeiro casamento do português que deu origem à família. Casou-se com o major Higino Rolim, em celebração do padre Rolim, ouço de meu pai, como se ali também estivesse ele. Mas quem está sentada à mesa é minha irmã freira, salesiana, Isabel, que chegara de Petrolina, onde dirige o Colégio Maria Auxiliadora
– E isso aí na sua mão?
A voz timbrada de minha mãe me puxou para junto dela. É a primeira versão da biografia do padre Ernando Teixeira, lhe disse, trouxe pra senhora dar uma olhada.
Tirou do envelope-bolsa, segurou o calhamaço e folheou com atenção, enquanto Isa e eu continuamos o papo. À frente do Colégio ela se equilibra entre a prepotência oligárquica dos Coelho, sob o fogo oposicionista do padre Mansueto de Lavor, que usa a Rádio Rural de Juazeiro, do outro lado do São Francisco. Petrolina está cheia de gente atraídos pelo surto de crescimento econômico. Isa visita mamãe, antes de viajar a Roma, para a posse do novo papa e participar de reunião de sua Congregação.
– E por que você escreveu este livro?
Ocupo a Cadeira que pertenceu a Ernando no Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, ele se dedicou muito a estudar a vida de padre Ibiapina. Minha mãe volta à leitura do futuro livro, sem mexer os músculos, concentrada.
Saímos para olhar o sítio, Isa e eu.
O mesmo umbuzeiro… o chão molhado neste mês de julho, cachos de bananas pendurados, goiabeiras, os pés de azeitona, pinha, graviola, caju, coco, carnaúba, mangueiras enchendo o chão de folhas secas. Junto à casa de Tantino, a secular sombra do tamarineiro.
Parece o sítio do Centro Cultural de São Francisco, em João Pessoa, hein Isa, onde funcionou o Seminário Arquidiocesano da Paraíba. Ela riu… ora, Chico, onde você nunca pensou colocar os pés para estudar, falou, o sorriso cúmplice da irmã de fé!
– Frassales!
Voltamos à cozinha.
Com o mesmo timbre de voz, serena feito voo de garça, o amor derramado sem exuberância, a alegria traída pelo brilho nos olhos miúdos, o calhamaço de papel em cima da mesa, minha mãe abraçou o filho caçula:
– Mas você sempre foi um cristão de meia tigela!
Francisco Sales Cartaxo Rolim é sócio da Academia Cajazeirense de Artes e Letras.
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