Meus avós maternos e paternos

Por Francisco Frassales Cartaxo – Conheci apenas vovó Joana, já em fase de caducar. Guardo poucas lembranças da casa na Rua Padre Rolim. Um pouco mais da casinha em frente ao futuro Estádio Higino Pires, que foi reformada para residência de dr. Dingo Sobreira, marido de Gildete, filha do agrônomo Fernando Cartaxo. Vituriano de Abreu a ocupou mais tarde.
Perto da Vila Isabel, onde nasci, eu ia com frequência visitar vovó e suas três filhas solteiras. Lembro esta cena: passo miúdo vai ao fundo do quintal, levanta a saia, faz xixi, volta indiferente ao mundo. Fazia isso com a naturalidade de descendente da indiazinha, preada na beira do rio por algum colonizador português. Ouvi isso vezes sem conta.
José Joaquim de Brito (major Zuza da Inácia), marido de minha avó, morreu muito antes de meu nascimento. Comerciante, pequeno agricultor no Cariri cearense, subdelegado de distrito, dele pouco falavam. O mais interessante se liga à fuga para São João do Rio do Peixe, após a vitória dos rebeldes da Sedição do Juazeiro (1914). Perseguido pelos partidários de padre Cícero, foi forçado a esconder-se num morro perto de sua casa. A filha mais velha, tia Catia, levava comida, roupas, notícias ao pai foragido!
Vendeu às pressas suas terras e busca proteção do padre Cirilo de Sá. Ali recomeça sua vida de comerciante, trazendo mercadorias de Fortaleza para vender. Depois, resolve mudar-se para Cajazeiras, a fim de educar seus sete filhos: quatro filhas moças e três rapazes.
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Agora, faço mero exercício de imaginação.
Suponho que o antigo subdelegado distrital em Várzea Alegre (que também morou no município de Lavras) tenha ficado satisfeito quando recebeu cerimoniosa visita de emissário do viúvo Cristiano Cartaxo. Farmacêutico diplomado no Rio de Janeiro, em 1913, filho do major Higino Gonçalves Sobreira Rolim, que também era farmacêutico, desde 1875, por Decreto de dom Pedro II. Exercia legalmente a profissão e até fazia as vezes de médico, mercê da ausência destes profissionais no vasto interior do Brasil.
O intermediário teve sucesso em sua missão, mas encontrou resistência do major Zuza da Inácia para entregar a filha preferida do solitário viúvo, que perdera a jovem e linda prima Ilina Matos, no segundo parto. Filha do coronel Joaquim Gonçalves de Matos Rolim, de Lavras, instalara-se em Cajazeiras com muito sucesso econômico.
Em jeito de ficção, narro como teria sido o diálogo.
– Tenho até muita satisfação em entregar a mão de umas das meninas. Inacinha, a mais velha, é muito prendada, faz por merecer dr. Cartaxim.
– Major Zuza, Cartaxim talvez prefira outra, o senhor sabe…
– Mas as outras são muito novas ainda!
– Devemos respeitar o sentimento que brota no coração de Cartaxim, o senhor não acha?
O major Zuza remexeu-se na cadeira. A voz saiu tremida diante daquela surpresa.
– Quem seria então?
– Isabel… Cartaxim quer Isabel.
– Mas compadre, Belinha só tem 16 anos!
Não houve jeito nem argumento.
Em pouco meses, no dia 12 de setembro de 1921, justo ao completar 17 anos, Isabel se casa com o viúvo de 34 anos, tirada da escola de formação de professoras, para ter 12 filhos e cuidar da gente.
O folhetim continua.
Sócio da Academia Cajazeirense de Artes e Letras
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