Labaredas mal educadas

Por Mariana Moreira – As labaredas se espalham com a velocidade do vento, tangendo fagulhas a incendiar a teimosa vegetação que insiste em brotar as margens da rodovia. Uma ave de canto triste desenha no ar imaginários círculos como a imprimir um grito de socorro pelo ninho destroçado pelas chamas inclementes que consomem folhas, galhos e filhotes indefesos, cujos frágeis ninhos não são suficientes como barreira de proteção para a irresponsabilidade humana.
As cenas se tornam rotineiras nas estações secas. A caatinga, ao desencadear os naturais mecanismos de proteção e sobrevivência, despindo-se da folhagem, se torna mais suscetível ao fogo, irresponsavelmente atiçado por ações humanas. Fogo provocado por bitucas de cigarro, por fogueiras improvisadas por caçadores de mel de abelha, ou mesmo, por proprietários que, desmatando a caatinga, lançam fogo em suas brocas as margens das rodovias, sem o devido cuidado em construir os aceiros com a dimensão necessária para evitar a propagação do fogo além da área desmatada.
O triste canto da ave, em seu desesperado voo de sobrevivência e perda, permanece como uma incômoda lembrança, mas também como um insistente e necessário alerta, sempre que, ao lançar o olhar em qualquer direção, a qualquer hora, somos contaminados pelas colunas de fumaça que se erguem como evidência das queimadas consumindo ninhos, plantas, vidas e, também, a possibilidade de futuro para o planeta.
Ao voo solitário da ave se soma o olhar triste do camaleão que apressa a corrida na desesperada tentativa de sobreviver ao extermínio de plantas e árvores que lhe dão abrigo, proteção, alimento e guarida. Borboletas ensaiam voos desesperados vendo exaurir-se as derradeiras flores que lhes emprestam beleza e vida. Revoadas de insetos e abelhas buscam outras direções para escapar do asfixiante destino do fogo, da fumaça e da destruição de colmeias, ocos de árvores, troncos secos onde, outrora, o ritmo da vida lhes dava abrigo, proteção, lugar de continuidade da vida.
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Mas, o que falta para que este cenário de destruição e terror seja cessado? Respostas, tantas. Ações, poucas. Ou nenhuma. A primeira ação nasce em nós mesmos. Educação. Não só escolar, mas, sobretudo, humana. O simples e “inocente” gesto de arremessar a bituca do cigarro pela janela do carro tem uma dimensão trágica que vai muito além do meu vício. Nos educarmos para compreender que nossos gestos e ações são culturais e, portanto, repercutem e ecoam para além das fronteiras individuais. O fogo da broca sem os cuidados necessários para evitar sua expansão além da área devastada. A fogueira para afugentar abelhas e extrair o mel das colmeias que se espalham em troncos e ocos de árvores e que, irresponsavelmente, fica queimando além da ação de extração do mel, também revela uma deseducação humana.
E assim, Vital Farias nos adverte que, nesse processo educativo, não podemos esquecer:
O que se corta em segundos gasta tempo prá vingar.
E o fruto que dá no cacho prá gente se alimentar?
Depois tem o passarinho, tem o ninho, tem o ar.
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